Pelo que indicam todas as projeções, a pior parte da pandemia de Covid-19 parece já ter sido superada, graças à vacinação em massa. Entretanto, o estrago causado pela crise ainda levará algum tempo para ser superado, e isso cria ameaças e oportunidades, inclusive para as exportações do agronegócio, carro chefe e maior mola propulsora da economia brasileira.
O que aconteceu com a economia
Após tanto tempo de atividades reduzidas, ou até mesmo paralisadas, dependendo do setor da economia houve uma desorganização econômica em escala global, envolvendo desde fábricas a cadeias logísticas, cujos efeitos estamos sentindo agora.
Essa é a mais provável explicação para notícias preocupantes como aumentos dos preços do petróleo, falta de gás natural em alguns mercados, escassez generalizada de componentes, falta de matérias primas e preços de minério de ferro e comodities agrícolas caindo e fretes internacionais subindo ainda mais. O reflexo desses problemas aparece imediatamente com juros subindo, inflação em alta no mundo e na volatilidade das bolsas de valores.
A esses problemas causados pela pandemia, se somam outros, como a crise hídrica no Brasil, que afeta, além da oferta de água, a de energia elétrica, visto que o peso das hidrelétricas em nossa matriz energética nos torna vulneráveis às estiagens, ou a ameaça de desaceleração da economia da China, causada pela crise da incorporadora Evergrande.
Como avaliar as ações dos governos e a questão da inflação
O aspecto mais visível dessa crise é a questão da inflação, que é basicamente causada pela escassez de produtos diversos, o que leva ao seu aumento de custos, que por sua vez, tem origem na desestruturação das cadeias logísticas mundiais.
Já era um problema conhecido pelos especialistas em logística no mundo que os portos das maiores economias do mundo, como Estados Unidos, estavam atravancados com mais navios carregados com mais contêineres do que era possível desembarcar rapidamente, o que causou não somente a falta de produtos, mas também dos próprios containers em si em outros países, como o Brasil.
Apesar de a questão da inflação, assim como foi a da restrição de atividades para frear a pandemia, sair muito facilmente da análise econômica para uma questão política, infelizmente há muito pouco que governos e bancos centrais possam fazer no curto prazo, já que se trata de uma questão de infraestrutura que, em um momento de retomada econômica, simplesmente não dá conta de toda a demanda reprimida.
Cabe aos bancos centrais, inclusive o do Brasil, controlar a inflação com as ferramentas disponíveis, lembrando sempre de que não se trata de uma inflação causada por um aumento de demanda que poderia ser controlada encarecendo o crédito, mas por uma escassez de bens, que só pode ser resolvida pela normalização das cadeias logísticas mundiais, que levará um tempo ainda indeterminado para acontecer.
Existem oportunidades nesse cenário?
Em tese, qualquer ator, público ou da iniciativa privada, que eventualmente oferecesse soluções logísticas que aliviassem o problema atual com mais rapidez teria enormes ganhos. Mas nada indica que possa aparecer uma solução que resolva um problema dessas dimensões no curtíssimo prazo. Ou seja, o mundo terá de conviver ainda por algum tempo com a crise logística.
Mas, no logo prazo, grandes oportunidades se colocam para o agronegócio brasileiro. A crise logística e a escassez deixarão lições, especialmente onde a segurança alimentar é uma questão mais grave, como o Oriente Médio e diversos países da Ásia, tradicionais importadores de produtos do agronegócio brasileiro, que em 2020 respondeu por 48% das exportações totais do Brasil, que em 2021 poderão chegar a U$.120 bilhões.
E os maiores compradores serão os países do Sudeste Asiático, incluindo a China, e os países do Oriente Médio. A Ásia, especificamente, será responsável por 60% do consumo de classe média no mundo em 2030, o que afetará não somente a quantidade de alimentos que esses países comprarão, mas a qualidade.
Oportunidades no longo prazo
A previsão de aumento na demanda mundial por alimentos já causa movimentações entre os atores do setor, que pedem, entre outras demandas, o fim dos subsídios agrícolas e oferecidos pelos países ricos, especialmente da Europa, para seus produtores rurais.
Mas nada indica que tais subsídios, ou outras medidas protecionistas, diminuam tão cedo. O que o Brasil pode ou deve fazer é investir na sua competitividade no que tange à fatores como a logística dentro do Brasil, onde ainda existem grandes gargalos, mas que fazem parte da formação de preços dos produtos do agronegócio no exterior.