Antes do início da pandemia, um dos grandes quase consensos mundiais era a respeito da necessidade de combater o aquecimento global através da adoção acelerada de energias limpas, que despejam menos gases de efeito estufa na atmosfera, e a diminuição do uso de energias sujas, baseadas na queima de petróleo e carvão.
A substituição de energias sujas por energias limpas
Em uma situação normal, substituir uma matriz energética suja que moveu os séculos XIX e XX por outra mais limpa em escala mundial já seria um desafio econômico e político de enormes proporções. Todos são a favor em teoria, mas a prática envolve um investimento que governos e empresas relutam em fazer. E economias e empresas que competem entre si globalmente cobram das outras que façam também a sua parte.
Esse impasse aparentemente insolúvel havia sido quebrado por uma conjunção de fatores: As alterações no clima visíveis a todos, com suas consequências indesejadas, a contínua pressão política de ambientalistas, que deixou o nicho político dos adeptos de uma causa para se tornar um quase consenso global, e o desenvolvimento tecnológico, que tornou o uso de energias limpas, como a eólica e a solar, mais economicamente viáveis.
Segundo a Agência Internacional de Energia Renovável (AIER), nos últimos 20 anos as energias renováveis geraram 26% da eletricidade consumida no mundo.
Mas se o uso dessas energias se tornou mais viável do que havia sido algumas décadas atrás, isso não significou que automaticamente a tecnologia ou as condições necessárias para a sua adoção se tornassem acessíveis a todos, para que o mundo deixasse de lado as energias sujas e a queima de petróleo e carvão se tornasse coisa do passado. Queria dizer apenas que podíamos ser otimistas, e em algum momento do século XXI, se tornaria possível e viável.
Foi nesse contexto que ocorreu a pandemia de Covid-19.
A recuperação econômica pós pandemia e a questão energética
Nos primeiros meses da pandemia, que foram enfrentados com distanciamento social e, em alguns países, lockdowns, a diminuição do número de veículos em circulação parecia ter materializado o sonho dos ambientalistas mais radicais, com as emissões veiculares e a poluição diminuindo nas grandes cidades a ponto disso poder ser percebido nas coras do pôr do sol, inclusive em cidades como São Paulo.
A queda do consumo de petróleo fez os preços caírem ao nível mais baixo da história em 2020, mas com inevitável, e sim, muito desejada retomada das atividades econômicas e da vida próxima do que era o normal pré-pandemia, graças à vacinação em larga escala, a demanda de praticamente tudo aumentou, inclusive de energia.
Em uma situação em que as economias ,em fase de recuperação, enfrentam escassez de vários itens, por causa do caos causado pela desestruturação das cadeias produtivas e logísticas do mundo, o mesmo ocorre com a energia, condição agravada por condições climáticas atípicas, inclusive no Brasil.
A demanda mundial por petróleo, carvão e gás natural chegou a números altíssimos, devido a condições climáticas atípicas e ao aumento da demanda pela retomada da economias da pandemia da COVID-19
A demanda por petróleo no curto prazo
A Agência internacional de energia (AIE) estima que a demanda mundial por petróleo chegará a aproximadamente a 100 milhões de barris por dia, em 2022, próximo aos níveis da pré-pandemia, mas ainda assim a produção mundial encontra dificuldades para atender consumo crescente nos países que se recuperam da pandemia.
Os preços do petróleo Brent , referência mundial da commodity, chegaram a US$. 85,00 por barril, nível mais alto nos últimos três anos. Os operadores apostam que os preços continuarão em alta, alimentando em muito o mercado de opções.
Entretanto, os investimentos totais em petróleo e gás, sem contar com as bacias de xisto, em 2-21 alcançarão US$.360 bilhões , aproximadamente 26% a menos do que antes da pandemia, segundo a AIE.
O investimento em petróleo e a questão climática
Embora o aumento da demanda e dos preços sejam um óbvio estímulo para o aumento da produção de petróleo, para cumprir as metas do Acordo de Paris sobre o clima, o nível de investimentos na produção de petróleo deverá ser mantido nesse mesmo patamar pelos próximos dez anos, para depois cair ainda mais, para manter a meta preferencial do aumento das temperaturas mundiais em torno de 1,5°C.
O futuro das energias limpas
Embora a questão do aquecimento global seja um fato comprovado, na era das redes sociais, em que todos têm uma opinião, independentemente de ela ser baseada em conhecimento científico ou fonte respaldada, no momento em que a questão da escassez energética está em evidência, já é possível ouvir ruídos tanto de negacionistas da ação humana como causa do aquecimento global como da viabilidade da transição para energias limpas.
Tal posicionamento deve ser entendido dentro da lógica de extrema polarização política que contamina as redes sociais, associando a questão ambiental e todas as questões relacionadas, como as energias limpas, a disputas político-ideológicas.
Sem entrar na discussão política, que produz muito calor e pouca luz, não custa lembrar que os sistemas de produção de energias limpas são antes de tudo aplicações de tecnologia, cuja eficiência aumenta à medida que o uso evidencia as limitações e cientistas e engenheiros trabalham para superá-las.
Para quem tem dúvida disso, basta pesquisar qual era a potência e desempenho dos motores à explosão de automóveis, caminhões e até veículos militares a aproximadamente 100 anos atrás, durante a I Guerra Mundial, e a potência e desempenho das versões atuais desses mesmos veículos hoje em dia.
A pesquisa e o desenvolvimento de energias limpas ainda tem um longo caminho a percorrer, e o objetivo é garantir um planeta melhor para se viver para as próximas gerações.
COP26, A Conferência do Clima de Glascow
É nesse contexto no mínimo desafiador, de um objetivo que é de longuíssimo prazo, mas cuja busca não pode ser adiada, e as questões urgentes da recuperação econômica pós pandemia, que entre 31 de Outubro e 12 de Novembro, os líderes mundiais se reunirão na Escócia, para a conferência do clima de Glascow, a COP 26. O objetivo da conferência é acelerar a transição a uma matriz energética mais limpa e reduzir as emissões de efeito estufa.
O impasse que se coloca para esses líderes é que a redução da emissão de gases de efeito estufa continua sendo um problema urgente, que exige investimento, e se os países ricos apoiarão financeiramente os menos desenvolvidos nessa transição para as energias limpas.
Essa questão interessa muito ao Brasil, não somente por ter sua cota nas emissões, tanto por parte da indústria, como do agronegócio, como por ser o dono da maior parte da Floresta Amazônica, um bioma vital para o equilíbrio climático do planeta.
Países têm interesses econômicos e políticos, que são legítimos. Mas não podem esquecer que todos estão no mesmo Planeta Terra, e eventos climáticos adversos não respeitam fronteiras políticas.