Brasil-EUA-OMC

OMC – O que você precisa saber sobre a declaração conjunta Brasil-EUA

O Brasil assinou uma declaração conjunta com os Estados Unidos afirmando não haver na Organização Mundial do Comércio – OMC, uma entidade central na governança global, espaço para modelos econômicos diferentes da economia de mercado, criticando países que utilizam políticas e práticas que criam condições de competição desleais, impedem o desenvolvimento e uso de tecnologias inovadoras e minam o funcionamento do comércio internacional

Segundo a declaração, o princípio da Economia de Mercado tem de valer para todos os 164 membros da OMC, para garantir condições de competição econômica saudável no comércio internacional. Embora a declaração não tenha citado especificamente quem não estaria seguindo corretamente os princípios do livre mercado, ficou muito claro que ela tinha um alvo: A China.

Os representantes chineses no Conselho Geral da OMC afirmaram que a OMC não seria o fórum adequado para discutir o que é economia de mercado, sem colocar, entretanto, onde e quando esse debate poderia ser feito. E se estariam dispostos a fazê-lo.

Vários países entre os mais ricos e industrializados, como os 27 da União Europeia , Japão, Coréia do Sul, Noruega, Taiwan. Austrália, Canadá e Suíça, apoiaram o conteúdo do posicionamento brasileiro e americano, de que economia de mercado é um princípio fundamental para a reforma da OMC. A Índia, um país que tem um histórico de rivalidades com a China, foi mais ambíguo, colocando que quem dúvidas deveria procurar o Tribunal de Apelação.

A OMC no contexto da disputa EUA x China

O Tribunal de Apelação da OMC se encontra inoperante, impedindo que a entidade tenha qualquer influência prática na resolução de conflitos comerciais entre os países membros. A razão disso foi justamente os EUA não terem indicado os juízes para esse tribunal, quando dentro de sua reação ao desafio chinês pela liderança mundial, optaram por esvaziar não somente a OMC, mas outras instâncias de negociação multilateral internacional,

A própria Parceria Transpacífica, um acordo comercial que reunia Brunei, Chile, Nova Zelândia, Singapura, Austrália, Canadá, Japão, Vietnã, Malásia, México Peru e os próprios Estados Unidos poderia ter sido uma maneira de conter as práticas antimercado da China. Mas, direcionados por uma política que despreza o multilateralismo, os EUA optaram por se retirar do acordo em 2017.

Os Estados Unidos voltarem a incluir a OMC em seu discurso poderia ser positivo, caso sinalizasse que estariam abandonando a postura unilateralista dos últimos anos e voltando a acreditar nas instituições multilaterais para a resolução de conflitos comerciais. Mas, pelo que deu a entender até agora, trata-se somente de mais uma arena onde foi levada a disputa EUA x China pela liderança global. A conferir.

O que é uma economia de mercado

Em teoria, os critérios para definir o que é uma economia de mercado são relativamente simples: É quando não existe a interferência de um poder centralizador de informações e decisões e planejador, no caso, o Estado, para se definir variáveis como:

  • Determinação de preços
  • Custos
  • Regras de investimento
  • Alocação de capital
  • Financiamentos
  • Divisão do trabalho

O oposto disso seria uma economia em que o Estado centraliza todas as decisões e interfere em cada uma dessas variáveis em prol de um resultado geral que se acredita melhor.

Obviamente esses são os modelos teóricos. Da mesma maneira que não existem na prática economias totalmente livres de alguma regulação ou interferência do Estado, mesmo entre aquelas tidas como as mais liberais do mundo, todas as tentativas de implantar um modelo de Estado centralizador das decisões resultaram em indiscutíveis fracassos, que tiveram um custo muito alto para as populações dos países envolvidos.

Afinal, a China é uma economia de mercado?

Até que ponto , e quando,  o Estado pode interferir na economia de um país e este continuar a ser uma economia de mercado é algo que os economistas discutem desde sempre e não chegaram, ou chegarão, a um consenso, porque a Economia lida com números, mas nem sempre é uma ciência exata.

Sob esse pressuposto, se a China é ou não uma economia de mercado, poder-se-ia argumentar que com certeza não, já que existem acusações de que Pequim atua para favorecer as empresas chinesas com práticas desleais na competição externa, como dumping, subsídios diretos e dificultando ou impedindo o acesso de competidores estrangeiros ao seu enorme mercado interno.

Por outro lado, é inegável que a China fez progressos no caminho de assumir características de uma economia de mercado, como por exemplo, ter implementado uma legislação de proteção à propriedade intelectual. E que seriam passos dados de maneira cautelosa e segura, para que uma economia que 50 anos atrás tinha características socialistas se mova para um modelo diferente. Qual será esse modelo é mais uma das grandes perguntas do século XXI.

Se formos analisar a questão usando uma lente mais ampla, não se pode esquecer que países que apoiaram o conteúdo da declaração, como os da Europa, e os próprios EUA, subsidiam pesadamente sua agricultura. E que um dos maiores prejudicados é justamente o Brasil, que tem a agricultura mais competitiva do mundo em muitos produtos.

Mas, analisando ainda por um outro ângulo a questão nós, brasileiros, sabemos  que precisamos diminuir o chamado custo Brasil e investir muito em tecnologia, educação e capacitação de nossa mão de obra, para sermos mais competitivos nos mercados mundiais de produtos manufaturados. Mas enquanto isso não acontecer, esse será o motivo (ou pretexto?) para também termos uma economia mais fechada.

Em resumo, o arcabouço teórico do que é uma economia de mercado é simples. Mas sua aplicação para analisar a realidade é um tanto mais complexa.

A única certeza que se pode ter é reafirmar que a melhor maneira de resolver controvérsias é a negociação. E com os seus problemas e vantagens, organismos multilaterais como a OMC são fóruns adequados para isso. E nenhum país enriqueceu, ou melhorou a vida de sua população no longo prazo se fechando para o comércio.

Os riscos envolvidos na posição brasileira na OMC.

A última vez em que o Brasil tocou nessa questão foi em 2004, durante a visita à China do então presidente Lula que declarou na época que a China era uma economia de mercado. Mas desde então, não se avançou nessa discussão em matéria de qualquer tipo de posicionamento do governo brasileiro.

O que mudou desde 2004 não foi somente o posicionamento ideológico do governo brasileiro, embora devamos sempre reiterar que os interesses do país devem estar acima da ideologia do governo de turno. O contexto atual é da disputa cada vez mais aberta entre a China, que se coloca como candidata séria ao posto de maior potência econômica, científica, militar e política do mundo e o atual dono dessa posição, os Estados Unidos.

O desafio chinês à posição americana está longe de ser uma novidade. Já tinha se colocado pelo menos desde 2008, quando a crise do subprime atingiu a economia americana e colocou em evidência a China como locomotiva econômica do mundo. E estudiosos de História e Economia já colocam sua provável ascensão e um declínio relativo da posição americana como uma possibilidade.

Para entender o que significa declínio relativo, devemos entender o conceito colocado pelo historiador britânico Paul Kennedy no brilhante Ascensão e Queda das Grandes Potências. Não significa que os Estados Unidos se tornarão menos ricos e desenvolvidos cientificamente, ou poderosos militarmente. Significa que outro país poderá rivalizar com eles nesse sentido, e na capacidade de projetar esse poder para além de suas fronteiras.

O que é diferente no contexto atual é a maneira que os Estados Unidos têm reagido a essa situação. Ao contrário de administrações anteriores, que procuraram uma coexistência mais tranquila com a China, a atual tem apostado em uma retórica mais agressiva e em ações contra empresas chinesas, como a Huwaei , e até empresas e fundos de investimento americanos que investem na China.

Nesse contexto, de qual lado o Brasil deveria se posicionar? A resposta é do lado do Brasil, das empresas e dos empregos brasileiros, tomando cuidado com as posições favoráveis aos EUA, ou a qualquer outro país, sem receber as contrapartidas devidas. A China é o principal parceiro comercial do Brasil, com os chineses absorvendo quase 40% do mercado internacional do agronegócio brasileiro e em culturas específicas, como a da soja 72% das exportações brasileiras.

A disputa China Vs. EUA é uma luta entre dois contendores peso-pesado no campo científico, militar e econômico, onde o Brasil, apesar de ser uma das 10 maiores economias do mundo, é no máximo um peso médio. Como observou muito bem o vice-presidente da República, General Hamilton Mourão, o Brasil precisa saber jogar o jogo.

ESG – porque o governo e as empresas brasileiras devem falar sobre sustentabilidade

Qual o real tamanho dos danos à reputação do Brasil, e consequente, das empresas e marcas brasileiras, especialmente do agronegócio, causadas pelas queimadas que ocorreram no último ano? 22% da soja e 17% carne bovina produzidas na região da Amazônia e do Cerrado causaram desmatamento, como disse a reportagem da Science?

A resposta a todas essas perguntas é “não sabemos ao certo”. Como disse com muita propriedade o General Mourão, vice-presidente da República e chefe do Conselho da Amazônia, “o governo perdeu o controle da narrativa.” E é justamente para recuperar esse controle que o Brasil deve adotar padrões ESG e o governo e as empresas brasileiras devem falar sobre sustentabilidade.

ESG: O que significa e porque você deve prestar atenção.

ESG significa Enviromental, Social and Governance, Ambiental, Social e Governança. É um critério que analisa qual o comportamento das empresas em relação a cuidados ambientais, sociais e de governança. Ou seja, o nível de preocupação que elas têm com o impacto de suas atividades no meio-ambiente e na vida das pessoas. E se fazem tudo isso com ética e transparência, dentro das normas legais.

Um estudo feito pelo Banco Itaú BBA com 58 gestores de investimento, 40 brasileiros e 18 de outros países, mostra que o tema meio-ambiente e sustentabilidade entrou no radar dos investidores. De acordo com a pesquisa, 50% dos fundos estrangeiros afirmaram que a sustentabilidade tem um peso muito importante em suas decisões de investimentos. Entre as gestoras nacionais, apenas 25% estão mais sensíveis ao tema. Mas ainda é um número alto.

Essa diferença, de acordo com o relatório do banco, se explica porque os fundos de investimento estrangeiros se anteciparam na adoção dos padrões ESG, pela maior oferta de ações relacionadas a produtos em outros países e a menor divulgação de informações relacionadas ao tema por um número significativo de empresas listadas no mercado brasileiro, quando comparadas a grupos internacionais.

O tema da sustentabilidade, que em um passado não tão distante só tinha peso significativo para consumidores mais engajados com essa causa e empresas que faziam desse o seu propósito de marca, não somente se tornou relevante para um número crescente de consumidores, como entrou na pauta de cada vez mais empresas e investidores, que na era das redes sociais, não podem se arriscar a serem acusados de insensíveis à questão.

Setores mais vulneráveis do ponto de vista do ESG.

O agronegócio brasileiro, apesar da esmagadora maioria das empresas do setor seguir padrões elevados na questão da sustentabilidade, é o que tem sido alvo das maiores críticas, tanto no Brasil como no exterior. A grande maioria dessas críticas é honesta, embora muitas pareçam ser fruto de falta de informação à respeito do que o agronegócio efetivamente faz pela preservação ambiental,  que pode gerar uma certa má vontade com o setor. E há uma minoria que tem o objetivo de garantir reservas de mercado contra produtos brasileiros mais competitivos.

O mesmo estudo do Banco Itaú BBA, apesar de não citar o agronegócio como fonte de preocupações ambientais, apontou outros setores importantes para a economia brasileira como potenciais fontes de preocupação dentro de uma avaliação que use o ESG como critério, que são os seguintes:

Papel e celulose

Siderurgia

Mineração

Em virtude dos incêndios na Amazônia, o Brasil se tornou alvo de uma torrente de críticas, que poderiam ter sido evitadas com uma estratégia de comunicação que mostrasse todos os esforços brasileiros para a preservação do meio ambiente, como já sugerimos aqui. E, independentemente do que é narrativa e do que é verdade, os gestores públicos e privados devem entender o tamanho do risco e tomar as atitudes corretas.

Não custa relembrar que a questão da sustentabilidade não trata somente da preservação do ar que respiramos, oceanos, árvores e rios, como se isso não fosse motivo suficiente. Trata também da preservação de empresas, marcas e empregos brasileiros, que dependerão cada vez mais da opinião que os consumidores terão sobre eles para que possam, inclusive, atrair o capital dos investidores. Brasileiros e principalmente estrangeiros.

E não se trata somente de recuperar nossa credibilidade externa, coisa que não estamos conseguindo entrando em disputas de narrativa. Existem riscos que vão além disso, como as mudanças climáticas causarem um aumento da temperatura que nos faça perder culturas na zona central do país e na própria Amazônia.

O próprio governo brasileiro, cuja área econômica anunciou muitíssimo bem-vindas privatizações e concessões, deve se lembrar que o capital que espera atrair, na quantidade necessária, virá principalmente de grandes empresas e fundos de investimento. Mesmo que o Brasil seja um grande negócio para eles, e é, eles podem pensar duas vezes se o investimento gerar para eles uma crise de imagem.

 

4 Sugestões para tornar o Brasil um investimento atraente do ponto de vista do ESG

1) Lidar com a crise de imagem através de mensagem e linguagem únicas de setor público, entidades patronais, frente parlamentar agropecuária e Conselho da Amazônia a respeito do assunto;

2) Buscar desenvolver a agricultura regenerativa- meios de usar a terra-agricultura do século XXI;
3) utilização da bio economia na Amazônia;
4) criação da zona industrial verde bio econômica, talvez junto da zona franca de Manaus.

Obviamente, todas essas ações serão inócuas se não forem acompanhadas de uma fiscalização efetiva contra o desmatamento e o garimpo ilegais, que mesmo em pequena escala, podem causar um prejuízo de imagem muito grande. Mas é preciso começar por algum lugar.

Independentemente de qual seja a sua opinião sobre esse tema, não custa relembrar que estudos como esse feito pelo Itaú BBA abordam números. E os números falam mais do que as palavras.

retomada da economia

Cenários da economia e estratégias para a retomada de atividades

Depois de um período de quatro meses de quase paralisia em função da crise do coronavírus, a economia brasileira se prepara para a retomada das atividades, que foram total ou parcialmente interrompidas, dependendo do setor. Esse é um cenário que exige estratégias corajosas e pensamento fora da caixinha, porque apesar das dificuldades, também existem oportunidades no horizonte.

Para saber quais serão os obstáculos e as oportunidades, é necessário entender as especificidades de cada setor, os possíveis cenários macroeconômicos com que o Brasil irá lidar nos próximos meses e também o que restou do mundo pré-coronavírus que pode ser recuperado e o que está definitivamente perdido.

Resquícios do cenário pré-pandemia

A economia não estava aquecida antes do início da pandemia de covid-19. Embora não estivesse ruim como nos anos de recessão em que o Brasil teve PIBs negativos, o crescimento em torno de 1% dos últimos anos estava longe de ser exuberante. Mas havia boas perspectivas no horizonte e um crescimento mais vigoroso parecia uma questão de o governo se organizar politicamente e aprovar as tão aguardadas reformas econômicas liberalizantes.

Internamente, o mercado imobiliário dava sinais de recuperação após um longo período de baixa. O agronegócio continuava tão competitivo quanto sempre foi, com boas perspectivas internacionais, como o acordo com a União Europeia, com as únicas possíveis ameaças vindo mais de erros de comunicação do Brasil do que do fechamento de mercados internacionais ou o surgimento de novos concorrentes para disputar esses mercados.

A China se consolidava como player sério na disputa com os Estados Unidos pela liderança global, e o Mercosul continuava um bloco econômico muito mal aproveitado, com as oportunidades econômicas ficando em segundo plano por causa de disputas ideológicas entre países cujos governos tinham visões diferentes e interesses políticos internos de curtíssimo prazo.

Os cenários para a retomada da economia

Com a recessão mundial causada pela pandemia posta, os economistas discutem como será o gráfico da retomada da economia, sendo cogitados três cenários possíveis: Uma letra V, uma letra L e uma letra K, sendo cada uma delas a representação em um gráfico de linha dos cenários econômicos de curto e médio prazo, que podem afetar o longo prazo, dependendo de como o governo e as empresas brasileiras agirem.

A recuperação em letra V

Um cenário de recuperação em letra V é o mais otimista possível.  Se daria em uma situação em que a paralisação da economia tenha causado mais um adiamento do que uma desistência dos planos de consumo e investimento de pessoas físicas e jurídicas. E que, apesar da situação recessiva atual, haveria ainda capacidade suficiente dos atores econômicos para uma recuperação vigorosa, se houver estímulos governamentais.

A recuperação em letra L

Esse é um cenário mais pessimista, em que o gráfico da recuperação econômica se assemelharia a uma letra L, porque a recuperação seria tão lenta que sua curva de subida se assemelharia a uma linha quase horizontal. A razão de um possível cenário como esse seria a falta de estímulos econômicos, ou que eles não chegassem a quem precisariam chegar, o que aumentaria o custo humano da crise.

A recuperação em letra K

Esse é um cenário mais complexo, que pode se configurar no Brasil, de curvas de recuperação diferentes para empresas e pessoas físicas de acordo com a sua renda e tamanho. A razão disso seria que, por mais que os governos tenham ciência da necessidade de estímulos econômicos e até a boa vontade de fornecê-los, a operacionalização desse processo se dá através do sistema bancário, que tem a capilaridade e a expertise para isso.

Então, por depender dos critérios do sistema bancário, empresas maiores e pessoas de maior renda tem um acesso maior e mais rápido aos estímulos governamentais, a juros menores, enquanto empresas menores e pessoas de baixa renda demoram mais para receber o estímulo econômico, que quando chega, é em quantidade menor e a juros maiores, tornando sua situação mais difícil.

Esse fenômeno já pode ser observado, com o dinheiro barato dos bancos centrais chegando com  facilidade às grandes empresas e estimulando a rápida revalorização de seus ativos, e sua capacidade de manter empregos. Por outro lado, as empresas menores e os trabalhadores informais, que são 70% da mão de obra dos países em desenvolvimento, segundo o Banco Mundial, não estão tendo acesso a esse dinheiro, e passam grandes dificuldades.

A recuperação econômica mundial

Essa diferença na velocidade de recuperação também poderá ser observada entre cada país. Os países mais ricos e em melhor situação fiscal, com maior capacidade de injetar dinheiro em suas economias, tendem a se recuperar mais rápido. Por outro lado, aqueles que estiverem em uma situação fiscal ruim, caso da maioria dos países em desenvolvimento, terão menos capacidade de injetar dinheiro em suas economias e terão uma recuperação mais lenta.

A situação da economia brasileira

Embora um gráfico de recuperação em letra K esteja se desenhando na economia brasileira, existem outros fatores que podem influenciar o cenário. Por um lado, embora o Brasil tenha uma economia e um mercado muito maior que a maioria dos países emergentes, é inegável que temos uma situação fiscal delicada, que precede a pandemia e compromete a capacidade do Banco Central de injetar dinheiro na economia sem causar déficit.

Por outro lado, a crise também poderá gerar oportunidades dentro do Brasil, no sentido de que nossas autoridades econômicas já sinalizaram que pretendem continuar a fornecer estímulos ao mesmo tempo em que prosseguem nas reformas liberalizantes. Essa equação coloca objetivos aparentemente contraditórios, já que para injetar recursos na economia é preciso possuí-los, sob o risco de gerar uma espiral inflacionária grave.

A solução dessa questão estaria em um ambicioso pacote de privatizações, que se, para muitos era uma questão ideológica, se coloca cada vez mais como imposição da realidade. Se antes as privatizações eram vistas somente como uma maneira de diminuir o tamanho do Estado, aumentar a sua eficiência e diminuir possibilidades de corrupção, hoje se colocam também como uma maneira de gerar recursos. Talvez a única, no montante que precisamos.

Colocadas a necessidade e a oportunidade, o que faltaria seria comunicá-la aos investidores estrangeiros, passando os sinais corretos, que seriam a segurança jurídica e a estabilidade política. E é justamente essa última que precisa de ajustes, pois em períodos recentes o Brasil se colocou em meio a polêmicas, especialmente relacionadas à questão ambiental, que não beneficiam de maneira alguma as empresas ou os cidadãos brasileiros.

A boa notícia é que autoridades e empresários no Brasil parecem ter percebido que a preservação ambiental não é somente uma questão de legado para as futuras gerações, mas também um poderoso argumento de comunicação para passar a mensagem correta a investidores e formadores de opinião em diversos lugares do mundo, como demonstram algumas ações de relações públicas e institucionais recentes.

Obviamente, ações de relações públicas serão somente um discurso vazio se não vierem acompanhadas de ações efetivas. Mas não se pode deixar de louvar iniciativas que buscam diminuir as tensões e incertezas, ao invés de potencializá-las, porque isso torna o ambiente de negócios melhor para quem trabalha e produz no Brasil, e mais atrativo para quem pretende investir aqui.

Dependerá única e exclusivamente do governo brasileiro passar a mensagem correta a investidores do mundo inteiro. O investimento saudita de USD 10 bilhões, anunciado na visita do Presidente da República em outubro de 2019, começou a se concretizar, com o Fundo Soberano da Arábia Saudita anunciando uma injeção, em valores ainda não revelados, no fundo de investimentos brasileiro Pátria.

Estratégias de retomada de atividades para as empresas brasileiras

As empresas brasileiras devem se preparar para um período de desafios. Não somente porque o mercado doméstico começará a retomada recessivo, e o mercado externo poderá ser uma boa alternativa, mas porque a recessão será global, o protecionismo aumentará, e competidores estrangeiros podem ver no Brasil a solução para os seus próprios problemas, às custas da participação de mercado e da margem de lucro das empresas brasileiras.

Então, as empresas nacionais devem se preparar para serem mais competitivas, encarando a concorrência estrangeira tanto nos mercados de outros países como no próprio mercado brasileiro. As estratégias a serem adotadas dependerão tanto do tipo de produto ou serviço que se deseja vender como das características dos mercados e dos consumidores que se quer atingir. Vamos a elas:

Internacionalização

O processo de internacionalização consiste na adoção de normas e procedimentos de padrão internacional, que levam a uma redução de custos, aumento da produtividade, adoção de novas tecnologias e melhora de produtos, gerando aumento da competitividade para disputar os mercados doméstico e externo.

Para quem é internacionalização é recomendada

Cabe à empresa identificar qual o seu próprio DNA, no sentido de entender as características do seu negócio, de seu produto, do mercado que pretende disputar, de quem são seus principais concorrentes, os potenciais clientes e como eles percebem valor em produtos e serviços. E com base em todas essas informações, definir sua estratégia.

Por exemplo, uma empresa que vá disputar um mercado unicamente com base em preços, com produtos comoditizados, ou que tenha uma estratégia baseada em diferenciação do seu produto, inclusive se buscar atender a nichos de mercado, pode obter muitos lucros passando por um processo de internacionalização.

Internacionalização 2.0.

O processo que chamamos de Internacionalização 2.0 é detalhado aqui, e envolve a logística e o uso intensivo de tecnologia adaptado ao mundo pós-pandemia. Mas o que as empresas mais devem prestar atenção é às estratégias de marketing que irão utilizar, envolvendo a promoção de suas marcas e o seu posicionamento.

As estratégias de posicionamento são as mais variadas possíveis, dependerão muito de qual produto ou serviço se está promovendo, e para qual público-alvo. Mas para quem está pensando em atingir os principais mercados do mundo, algumas pesquisas feitas com consumidores no Brasil e no exterior já apresentam algumas informações interessantes, que configuram uma tendência.

A primeira delas vem de uma pesquisa feita pela consultoria LLYC, que indicou que 73% dos consumidores na Europa e América Latina  dão preferência à marcas que valorizem a experiência do consumidor e tenham propósito, ou seja, existam para contribuir com um mundo melhor, o que, pela associação automática entre Brasil e a causa ambiental, pode ser uma grande oportunidade para as empresas brasileiras.

A segunda vem de uma pesquisa feita pelo  Boston Consulting Group , que entrevistando 3249 pessoas na China, Estados Unidos, França, Índia, Indonésia, África do Sul e Brasil, constatou que elas dão importância a causas como redução das emissões de carbono, não associação com práticas ilegais, e reposicionamento da cadeia de suprimentos.

Conclusão

No mundo pós-pandemia de Covid-19, as ameaças estão colocadas, bem como as oportunidades. As empresas brasileiras podem agir de maneira passiva e reativa, esperando que a situação da economia e de seus mercados melhore, para que a delas melhore junto. Em resumo, se segurar e contar com um pouco de sorte. A outra maneira é agir de maneira proativa, para aproveitar as oportunidades que o mundo pós-coronavírus irá criar.

Independentemente de qual seja a estratégia escolhida, é sempre bom lembrar que a sorte favorece quem se prepara.

classe-media-china

Nova classe média chinesa é chave para entender porque o comércio mundial depende da China

Após a pandemia de Covid-19, a relação entre a China e o resto do mundo irá mudar. Tanto em função das vulnerabilidades expostas pela crise dos respiradores, como pelo aumento das tensões geopolíticas entre Pequim e outros governos, que se sentem de alguma maneira ameaçados pelo crescimento chinês, como o Japão, com quem a China tem problemas históricos, e os Estados Unidos, que são abertamente desafiados em sua posição de primeira potência mundial.

O mundo anterior à chegada do coronavírus já observava uma mudança da posição da China de grande fábrica do mundo, a baixos custos, para marcas de outros países, para a de uma potência econômica, militar, política e científica, que não só foi o terceiro país a mandar um ser humano ao espaço com sua própria tecnologia, como hoje tem empresas cujas marcas disputam a preferência dos consumidores e considerável fatia de diversos mercados, em muitos países.

A chegada da pandemia de coronavírus mudou algumas tendências, e acelerou outras. Entre as que mudaram, está a da globalização econômica como a conhecíamos, com uma cadeia de valor mundial, que tinha a China como a sua grande fábrica de bens manufaturados. O mundo deverá se tornar mais protecionista, descentralizando a produção de itens estratégicos, em cadeias de produção regionalizadas, para não depender de um único grande produtor, como ocorreu na crise do Covid-19.

Outras tendências eram uma questão de tempo até que a simples disputa econômica da China com outras economias se tornasse uma questão também política. É o caso dos Estados Unidos, que perceberam no gigante asiático uma potência que realmente tem condições de disputar a liderança econômica do mundo, e do Japão, com quem os chineses têm questões mal resolvidas desde a II Guerra Mundial, e que por isso vê com receio a ascensão chinesa.

Essas duas situações convergiram para uma série de inciativas para tentar diminuir a dependência econômica do mundo em relação à China.

A economia chinesa atual

Independentemente de quais sejam as iniciativas, e de como se enxergava a China até pouco tempo atrás,  é preciso entender que não haverá uma volta ao status quo anterior, e que o crescimento do gigante asiático é uma realidade que se impõe, com o qual interagir economicamente não é uma questão de opção, como mostram os números do crescimento chinês, a mudança no perfil de sua economia, do seu mercado interno e principalmente no perfil dos consumidores chineses.

A participação Chinesa no comércio mundial

No século XXI, a China se tornou verdadeiramente a protagonista econômica do mundo. Em 2000, a participação da China no comércio mundial de bens  era de 1,9%. Passadas duas décadas, em 2019, cresceu quase oito vezes, chegando a espetaculares 15%. Em uma análise do fluxo comercial de 186 países, a China é o principal destino das exportações de 35 deles e a maior fonte de importações de 65 países, respectivamente.

A ascensão das marcas chinesas

Esse crescimento não significa somente o volume de bens que a China importa e exporta, mas o  aumento do valor agregado de produtos chineses, o que pode indicar um aumento da percepção de valor dos consumidores do mundo sobre as marcas chinesas, indicando que muito em breve o made in China deverá ter uma mudança de posição na mente dos consumidores, que se já não enxergam as marcas chinesas como falsificação, em breve deixarão de vê-las como segunda linha.

Embora a China ainda dependa da importação de semicondutores, dispositivos óticos, e de propriedade intelectual (PI) estrangeira, fez seu dever de casa para ter produtos competitivos. Saiu de um investimento anual em  pesquisa e desenvolvimento e US$. 9 bilhões anuais, 7,43% do PIB nominal, o que já era impressionante, para US$.321 bilhões em 2019 (22,7% do Produto Interno Bruto nominal). É o segundo maior investimento em P&D do mundo, aproximando-se dos EUA.

Há previsão de a China investir US$. 1,4 trilhão até 2025, sendo as empresas do país ainda mais presentes em rankings como o Global Fortune -500, que lista as 500 maiores empresas do mundo, que trouxe em 2019 mais de 120 empresas da China e de Hong Kong.

A participação da China nos mercados mundiais.

 

Além de ter ganho qualidade, a China é a maior produtora de praticamente tudo, respondendo por uma fatia muito considerável da produção industrial global, entre 40% e 60% do total,  em várias categorias de produtos importantes, de bens de consumo a bens de capital, como:

Automóveis

Painéis solares,

trens de alta velocidade,

sistemas de pagamentos digitais,

veículos elétricos,

equipamentos médicos

máquinas agrícolas,

smartfones,

serviços de nuvem-cloud

construção de robôs

Navios

O Mercado interno Chinês é cada vez mais de Classe média

60% da população da China já vive nas cidades, e os consumidores chineses estão enriquecendo gradualmente. Até 2030, 58% dos lares chineses estarão na categoria de afluentes de massa, com famílias com renda mensal média de aproximadamente US$.2.600,00, sendo que, apesar de sua posição no comércio internacional, o consumo interno chinês contribui com mais de 75% do impressionante PIB da China.

 A China também é um país conectado. Cerca de 800 milhões de chineses acessam a internet regularmente, mas o mais impressionante é que 40% da população urbana tem renda anual entre US$.10.600,00 a US$13.000,00, o que  significa que a classe média chinesa é de 400 milhões de pessoas, quase duas vezes o total da população do Brasil. E há previsões  de que até 2025, 75% da população da China se converta em classe média

Saiba mais sobre Internacionalização de empresas, e como acessar o enorme mercado Chinês clicando AQUI.

A dependência da China.

Os Estados Unidos têm adotado uma estratégia ambígua em relação à China, assinando um acordo comercial, mas tendo uma retórica agressiva, inclusive contra empresas chinesas, o que pode ser explicado em parte pelo período eleitoral americano, no qual a China é questão relevante para uma parte do eleitorado norte-americano. O Japão, por sua vez, propôs um pacote de USD 2 Bilhões em incentivos para que empresas japonesas retirem suas fábricas da China.

Tanto a estratégia de um confronto mais aberto, adotada por americanos e japoneses, como a da substituição parcial da globalização econômica pela regionalização continental, da qual inclusive o Brasil pode participar,  fazem sentido até certo ponto. Afinal, elas diminuiriam a dependência de um único país, que a experiência recente com as máscaras e respiradores mostrou que tem os seus perigos. E traria de volta a outros fábricas e empregos.

O problema da estratégia é que ela enxerga a China somente como concorrente, e a desconsidera como mercado. Será que faria sentido para, por exemplo, as montadoras e fábricas de autopeças japonesas  se retirarem da China e serem menos competitivas em um mercado que em 2017 emplacou 28 milhões de autmóveis novos e, como mostraram os números, só tende a crescer? E que será o maior comprador de praticamente tudo, com sua enorme classe média, cada vez mais afluente?

A mesma pergunta pode ser feita para qualquer empresa, em qualquer setor, de qualquer país do mundo.

As relações Brasil-China.

Nessa disputa entre gigantes econômicos, alguns questionam de que lado o Brasil deve ficar. Se existe uma resposta certa ela é o lado do Brasil. China e Estados Unidos são respectivamente nosso primeiro e segundo maiores parceiros comerciais, e o próprio Japão também é um parceiro extremamente relevante. E para as reformas econômicas que o Brasil precisa realizar, que incluirão privatizações, temos de estar abertos às parcerias e investimentos estrangeiros, sejam eles americanos, japoneses, chineses ou árabes.

Em relação ao gigante asiático, especificamente, China e Brasil tem economias complementares, com o Brasil podendo oferecer a segurança alimentar que a China precisa. As exportações brasileiras do agronegócio para a China alcançaram até maio de 2020, o volume de US$.16,51 bilhões, equivalentes à soma das vendas externas do setor para a Europa, América do Norte, América do Sul e Oriente Médio.

A dependência do Brasil, e de muitos outros países, do mercado da China não é uma questão ideológica ou política, como muitas vezes alguns discursos fazem parecer, mas da correta interpretação da realidade econômica. A presente crise traz incertezas, mas também oportunidades, que podem ser os catalizadores para uma reorganização produtiva do Brasil a médio e longo prazos, não somente para fornecermos produtos do agronegócio, mas muitos outros, para o promissor mercado chinês.

sustentabilidade marca Brasil

Selo de sustentabilidade ambiental poderia ajudar o posicionamento das marcas brasileiras

O tema da sustentabilidade ambiental já se tornou central na sociedade civil dos países considerados avançados, como Estados Unidos, Japão e países europeus. Ele tende a ganhar cada vez mais relevância em gigantes emergentes como Índia e China, especialmente com essa última assumindo cada vez mais abertamente sua ambição à posição de grande liderança econômica mundial.

No mercado brasileiro a questão da sustentabilidade também tem ganho cada vez mais relevância, com os consumidores  mais exigentes e informados dando preferência às marcas, empresas e produtos que tenham na preservação ambiental uma parte de sua proposta de valor. E essa é uma tendência ainda vai crescer, deixando de ser uma característica de um grupo específico de consumidores para se tornar um padrão do mercado brasileiro.

A competitividade das marcas brasileiras nos mercados mundiais.

Uma das características dos mercados do mundo pós pandemia é que as empresas com maior capacidade de competir nele serão as que adotarem o conceito de internacionalização 2.0, que você pode conhecer melhor aqui. Um dos pilares desse conceito é que ter bons produtos vendidos a preços competitivos é condição necessária, mas pode não ser o suficiente para as empresas brasileiras serem bem-sucedidas nesses mercados.

Não há dúvida de que acordos comerciais entre países e blocos econômicos, boa estrutura logística, custos de produção competitivos e produtos de boa qualidade foram e continuam sendo importantes. Mas é importante perceber também que eles só nos garantem o acesso aos mercados. Existe um segundo e importante passo na internacionalização de uma empresa, que é conquistar novos consumidores.

A estratégia das marcas brasileiras e a reputação do Brasil

Uma das constatações que os profissionais de comércio exterior e de marketing puderam fazer ao longo de anos de experiências nos mercados externos é que falta uma estratégia de marketing a boa parte dos produtos brasileiros. Existem honrosas exceções como os aviões da EMBRAER e as sandálias Havaianas, mas é muito mais comum ver produtos brasileiros competindo apenas em preço, sem se preocupar com o brand building.

A experiência mostrou também que existem vários cases de sucesso de países que se tornaram referências de excelência em diversos mercados, em que a designação de origem se torna uma garantia de qualidade do produto, como se fosse uma segunda marca, que agrega uma percepção de valor extra, que pode ser tão ou mais recnhecida pelos consumidores que a própria marca do produto em si.

Esse é o caso dos vinhos chilenos, design italiano, cafés colombianos, serviços de TI (Tecnologia da Informação) indianos, tecnologia japonesa, engenharia automobilística alemã, design escandinavo e muitos outros que poderíamos citar, que surgiram de maneira orgânica, pela excelência que esses países desenvolveram em certas áreas, ao longo de décadas e também através de um esforço coordenado para criar percepção de valor sobre os produtos do país.

Quando a origem é uma marca.

Os vinhos chilenos são um excelente exemplo. Existem inúmeras marcas disponíveis no mercado brasileiro, e nem todas são conhecidas dos consumidores, que nem sempre têm os conhecimentos sobre enologia necessários para perceber as diferenças entre cada tipo de vinho. Mas a percepção que se tem sobre o vinho chileno é que mesmo quem optar pelas marcas com preços mais em conta, fará uma boa compra.

Essa percepção de valor sobre a qualidade dos vinhos chilenos faz com que, dentro de uma mesma escala de valor, eles tenham vantagem sobre os concorrentes. Um consumidor que esteja disposto a gastar entre R$200 e R$500 em uma garrafa de vinho tem mais segurança em adquirir um produto chileno do que de outras procedências, porque entende que para ter a mesma qualidade de vinho, se escolhesse outras procedências, teria de pagar mais caro.

Essa percepção sobre o valor e a qualidade do vinho chileno para os consumidores brasileiros faz parte do que chamamos posicionamento de marca. É a posição que a marca ocupa na mente dos consumidores. E nesse caso, especificamente, a designação vinho chileno pode até ter mais força que a própria marca do vinho ou da vinícola.

Essa situação obviamente é muito conveniente para um produtor chileno, que mesmo se desejar fazer um trabalho de branding para reposicionar a sua marca, já partirá de uma posição mais confortável, muito melhor do que teria se os consumidores não tivessem nenhuma percepção sobre ela, ou pior ainda, que fosse uma percepção negativa.

Ameaças à percepção de valor sobre a marca Brasil

A designação de marca brasileira atualmente enfrenta um problema. Não somente porque até hoje não foi feito um trabalho consistente para agregar valor ao made in Brazil, mas porque existe uma percepção negativa a respeito do Brasil na área ambiental. E ela pode ser muito prejudicial não somente aos produtos do agronegócio, como alguns podem imaginar, mas a todos os produtos brasileiros e até à atração de investimentos.

Têm sido cada vez mais comum recebermos notícias de que em muitos países nos quais os exportadores brasileiros têm interesses, como Alemanha e Reino Unido, ONGs de preservação do meio-ambiente têm convocado boicotes aos produtos brasileiros, pressionando redes de supermercados para que não os vendam e consumidores para que não os comprem.

Sabemos que a preservação ambiental, especialmente a questão das mudanças climáticas, é uma causa que engaja e mobiliza milhões de pessoas no mundo inteiro. E que justamente por essa razão, se torna também uma questão política, tanto dentro do Brasil como fora dele. E que pode afetar, de maneira positiva ou negativa, a imagem das marcas brasileiras e do Brasil, tanto como país como destino de investimentos.

É justamente porque se trata de uma questão percebida como importante por pessoas que são consumidores, acionistas de companhias de capital aberto, pagadores de impostos, formadores de opinião e também eleitores, que as eventuais críticas devem ser recebidas com serenidade, e analisadas tanto pelo governo como pelas empresas brasileiras, que devem compreender que se trata de uma situação com ameaças, mas também oportunidades.

A imagem do Brasil no mundo e seus estereótipos

Todos os países do mundo são percebidos fora de suas fronteiras através dos estereótipos que as pessoas fazem deles, que são influenciados pelas suas imagens mais conhecidas, transmitidas através da mídia e pelos produtos da indústria cultural. São partes que influenciam a percepção do todo. No caso do Brasil, os elementos mais conhecidos positivamente fora de nossas fronteiras são o futebol, o carnaval e a Floresta Amazônica.

Existem também, não podemos negar, uma imagem negativa do Brasil, reflexo de nossas mazelas: um país com muita pobreza e desigualdade social, regras e legislações confusas, e um longo histórico de escândalos de corrupção na política, que podem intimidar potenciais investidores ou parceiros comerciais estrangeiros. E para piorar, uma cultura que parece aceitar tudo isso com naturalidade.

Pode parecer uma afirmação do óbvio elencar quais são os estereótipos positivos e negativos a respeito do Brasil no exterior. Entretanto, fazer com que essa situação mude é como planejar uma longa e penosa jornada. Precisamos saber onde estamos para definir onde desejamos chegar. E quanto tempo, e quais recursos, temos disponíveis para esse objetivo.

O reposicionamento da marca Brasil através dos estereótipos.

De uma maneira bastante resumida, se a imagem do Brasil no exterior é a de um país com a maior floresta tropical do mundo, a Amazônia, e pessoas do mundo inteiro se alarmam com imagens de queimadas e desmatamento, temendo pelo futuro da floresta, seria uma estratégia inteligente impedir essa devastação, preservando a floresta. E promovendo a imagem do Brasil e de suas marcas, como o país da sustentabilidade ambiental.

O selo de sustentabilidade brasileiro

O governo e as empresas brasileiras deveriam tomar a iniciativa de ter suas próprias regras e iniciativas de sustentabilidade, que seriam atestadas por um selo de certificação. E diferentemente das certificações ambientais já existentes, seria acompanhada de uma campanha de informação nas mídias tradicionais, sociais e até nos meios culturais, para informar aos consumidores de todo o mundo o que estaria sendo feito.

Seria antes de tudo uma diferença de abordagem. Ao invés do aspecto de comunicação da questão ambiental brasileira ser um caso de gerenciamento de crise, em que o governo e as empresas brasileiras precisam sempre se defender de acusações, seria um instrumento de reposicionamento de marca, mostrando o diferencial do país e das marcas brasileiras na preservação do meio ambiente.

Porque reposicionar a imagem do Brasil na questão ambiental

Esse reposicionamento de imagem seria uma estratégia muito mais produtiva do que entrar  em disputas narrativas sobre  que é verdade, e o que não é, sobre a Amazônia. E transformaria uma questão que hoje aparece como um ponto fraco na reputação do Brasil e das empresas brasileiras em um ponto forte, que os países que concorrem conosco para ser destino de investimentos, ou ter mercados para seus produtos, teriam dificuldade em igualar.

Brasil pode se tornar referência na sustentabilidade ambiental.

Se levada à frente, esse tipo de iniciativa não terá absolutamente nenhum valor se não refletir a realidade, se tratando apenas de uma ação de relações públicas para, utilizando uma expressão em voga atualmente, passar pano.

Mas, a boa notícia é que temos condições reais de criar uma economia ambientalmente sustentável, pois a vontade política já existe, com diversas empresas privadas atuando em coordenação com a Rede Brasil do Pacto Global das Nações Unidas e tomando iniciativas de sustentabilidade de uma maneira ampla, que combinam a preservação ambiental com a inclusão social

Energias limpas e renováveis são oportunidades imediatas para o Brasil na sustentabilidade ambiental

Um dos grandes dilemas do mundo pós-pandemia de Covid-19 é que os países que começam agora a retomar suas atividades dentro de um novo normal, que será necessário até que seja descoberta uma vacina, terão de encarar uma brutal recessão, cuja  recuperação dependerá de uma injeção de dinheiro tão grande que, antes mesmo de ser definida, já foi batizada de Novo Plano Marshall.

Nesse cenário, energias totalmente limpas, renováveis e de impacto ambiental baixo ou até insignificante, como a eólica e a solar, apesar de terem se desenvolvido muito ao longo das últimas décadas, ainda não são capazes de suprir toda a demanda energética mundial. E seu contínuo desenvolvimento ainda depende de investimentos e subsídios, que as economias impactadas pelo novo coronavirus podem ter dificuldade em fazer.

O receio de que muitas economias em recessão aumentassem o uso de combustíveis fósseis em função do preço baixo a que o Petróleo chegou no início da pandemia diminuiu, visto que a redução da produção pelos principais países estabilizou a oferta, e os preços tendem a uma alta. Mas independentemente do que aconteça com os preços do petróleo, que são historicamente voláteis, existe uma oportunidade para o Brasil no Etanol de cana-de-açúcar.

O etanol de cana-de-açúcar, que o Brasil é o maior produtor mundial, não é somente muito menos poluente que a gasolina e o óleo diesel, derivados do petróleo. O etanol de cana de açúcar é também muito menos poluente que seu concorrente renovável, o etanol de milho. E apesar de a sua queima também emitir dióxido de carbono, que contribui para o efeito estufa e as mudanças climáticas, a quantidade é muito menor.

E seria o primeiro passo dessa nova estratégia de comunicação explicar ao mundo que o Brasil tem condições de atender à demanda internacional não somente de etanol, mas de outros produtos do agronegócio, sem derrubar uma árvore sequer da Floresta Amazônica.

O posicionamento da marca Brasil, a sustentabilidade e a questão política

Quem acompanha os recentes noticiários tem visto declarações e posicionamentos por parte de governos e de fundos de investimento norte-americanos, europeus e asiáticos criticando medidas do governo brasileiro, que eles temem que estimulem o desmatamento na Amazônia. Mesma razão pelo qual políticos europeus,  especialmente da Holanda e Alemanha, têm posto em dúvida o acordo comercial Mercosul – União Europeia.

A razão de toda essa repercussão é, como já colocamos, a importância que muita gente nesses países dá à preservação da Amazônia, o que a torna a questão também política e de gestão de imagem. Se o Brasil se transformar em um pária ambiental, governos e empresas que fizerem negócios conosco se arriscarão a sofrer um grande desgaste de imagem por associação, algo com o que não tem nada a ganhar.

Sabemos que em meio a uma imensa maioria de cidadãos que têm uma preocupação sincera e razoável com a preservação da floresta amazônica, existe uma minoria de radicais, de políticos em busca de visibilidade e, em alguns países, de lobistas que usam a sustentabilidade ambiental como um pretexto para evitar a entrada em seus mercados dos produtos do agronegócio não somente do Brasil, mas de outros países do Mercosul.

De minorias radicais e oportunistas políticos, sempre se pode esperar um barulho desproporcional aos fatos. Mas é preciso separar o joio do trigo e entender que esse ruído só repercutirá fora de grupos muito específicos e restritos, influenciando o comportamento de consumidores, investidores e, no limite, de eleitores, se o governo e as empresas brasileiras não agirem para diminuir os receios das pessoas, ao invés de aumenta-los.

Concluindo está nas mãos do governo e das empresas brasileiras a oportunidade de fazer da sustentabilidade ambiental um fator de percepção positiva do Brasil e de nossas empresas, e de acrescentar à marca Brasil o propósito da preservação ambiental, que pode fazer com que consumidores ao redor do mundo consumam, orgulhosamente, produtos made in Brazil.

quanto valem as marcas brasileiras

Quanto vale uma marca brasileira no exterior

Quando vale um produto que carrega orgulhosamente “made in Brazil” nos principais mercados do mundo? A designação de origem brasileira de um produto agrega valor a ele na percepção dos consumidores dos principais mercados do mundo, como Estados Unidos, China, Japão, ou União Europeia? Existe uma “marca Brasil”?

A resposta para todas essas perguntas é: infelizmente, não. Com exceção de nossos atletas profissionais de futebol, que podemos considerar como prestadores de serviço valorizados e muito bem pagos em todos os lugares do mundo, também por serem brasileiros, a designação de origem brasileira não representa um grande diferencial para os nossos produtos. Ou seja, não existe uma marca Brasil que acrescente um dólar sequer ao valor percebido dos produtos brasileiros no mercado externo.

Mas poderia ser diferente. Da mesma maneira que o futebol brasileiro se tornou uma grife internacional pela qualidade mostrada, não somente pelo maior de todos, Pelé, como por outros atletas que vieram depois dele, alguns países se tornaram especialistas em certos tipos de produto ou serviço. E essa percepção de especialização por parte do público torna qualquer produto relacionado a ela, que venha desses países, mais valioso.

Essa percepção pode surgir tanto de uma forma mais “orgânica”, quando muitas marcas de excelência surgem no mesmo país, e com o tempo o consumidor começa a associar esse país ao produto ou serviço, quanto de uma forma planejada, como resultado de um esforço organizado e de um investimento, que pode ser realizado tanto por uma associação de produtores como de uma autoridade nacional ligada ao governo.

Vamos analisar alguns casos, em ambas as modalidades.

Design Italiano

O termo design italiano remete a produtos inventivos, inovadores, com acabamentos cheios de detalhes e requintes e o uso inventivo de materiais. Embora alguns considerem que a “escola italiana de design” seja uma consequência “inevitável” de toda a herança artística e arquitetônica que vem desde o Império Romano, passando pela Renascença, foi a partir do século XX que os designers italianos ganharam fama e respeito do mundo inteiro.

Design Italiano é um selo de qualidade que valoriza muitos produtos, que não necessariamente tem algo a ver um com o outro, como por exemplo: projetos de arquitetura, peças de vestuário, mobiliário, artigos de decoração, utensílios, calçados, motocicletas e automóveis.

Não se tem notícia de uma ação de marketing específica para divulgar e valorizar o design italiano no mundo. Mas foram tantos estúdios e profissionais fazendo um trabalho de excelência que a percepção de valor do design italiano surgiu naturalmente, criando como que uma segunda marca que acompanha todos os produtos daquele país.

Para citar somente um exemplo, podemos falar do estúdio Pininfarina. Embora seja mais conhecido pelo trabalho no setor automobilístico, com o Carrozzeria Pininfarina sendo responsável pelo design arrasador de ícones do automobilismo como Maserati, FIAT, Alfa Romeo e claro, Ferrari, o estúdio tem projetos premiados de bolas de boliche, bicicletas, cozinhas, celulares e dispensers de refrigerantes. No Brasil, têm projetos arquitetônicos de prédios construídos em São Paulo e Balneário Camboriú.

Tecnologia Japonesa

Quando o Japão terminou a Segunda Guerra Mundial derrotado e arrasado, pouco havia sobrado da estrutura industrial que havia sido levantada desde a Revolução Meiji. Para se reerguer economicamente, as indústrias de país precisavam aprender a produzir mais e melhor, com baixo custo, eficiência e qualidade.

E foi isso o que elas fizeram. Inicialmente vistos como de preços baixos e qualidade duvidosa, com o tempo marcas como Toyota, Sony, Mitsubishi, Nissan, Subaru, Honda, Mazda, Yamaha, Suzuki e Panasonic passaram a ser percebidos como sinônimo de qualidade, durabilidade e principalmente alta tecnologia em bens duráveis como eletroeletrônicos, instrumentos musicais, motocicletas e automóveis.

Embora hoje essas marcas tenham fábricas em muitos países do mundo, inclusive no Brasil, o termo tecnologia japonesa se tornou sinônimo de tecnologia de ponta, de alta qualidade, valorizando todos os produtos das empresas daquele país.

Carros alemães

A reputação da indústria alemã começou ainda no Século XIX, quando a Prússia liderou a unificação de todos os Estados que faziam parte da Confederação Germânica no Império Alemão, origem da Alemanha que conhecemos hoje. No início do Século XX, o país já era uma potência econômica e industrial, além de um dos maiores polos mundiais de pesquisa científica e tecnologia.

Esse desenvolvimento científico e tecnológico era aplicado a diversas áreas, inclusive a engenharia mecânica, que resultou no surgimento de diversas montadoras alemãs, como a Audi (1909), BMW (1916), Mercedes-Benz (1926), Porsche (1931) e Volkswagen (1937).  Embora elas tenham posicionamentos de mercado e de marca muito diversos entre si, todas carregam como “segunda marca” o carimbo de “carro alemão”, que é percebido por consumidores de todos os lugares do mundo como sinônimo de qualidade.

Café Colombiano

O café colombiano é um case que merece ser estudado pela competência com que foi feito um trabalho coordenado de promoção e posicionamento de marca através de uma designação de origem. E também, infelizmente, para mostrar como o Brasil perdeu lucros e participação no mercado mundial de café.

Resumidamente, durante muito tempo o Brasil, por intermédio do IBC, Instituto Brasileiro do Café, tratou o produto brasileiro como uma commoditie, trabalhando com uma estratégia de defesa de preços do produto como um todo, sem diferenciar os cafés de melhor ou pior qualidade.

Os produtores colombianos, por sua vez, usaram uma estratégia muito inteligente, de contar ao consumidor como era o seu processo de produção, modo de preparo, e as influências do clima e do solo do país, de modo a resultar em um produto supostamente superior ao brasileiro.

Em 1959 a Federação Nacional dos Cafeteros da Colômbia (Federacafe) contratou a agência de publicidade americana Doyle Dane Bernbach para a criação de uma campanha para valorizar o café colombiano e diferenciá-lo ainda mais do brasileiro.

A agência criou o personagem Juan Valdez, um típico cafeicultor colombiano, como o porta-voz internacional do café de Colômbia, e mais tarde um logotipo em que ele aparecia com sua mula, tendo ao fundo as cordilheiras nos quais o produto é cultivado. Juan Valdez aparecia em diversas peças publicitárias para a TV, colhendo os grãos e mostrando todo o processo de produção do café colombiano.

O resultado foi que os colombianos criaram o conceito do Café Gourmet, que hoje é explorado também por grandes varejistas, como a rede americana Starbucks. Mas isso não significa que o produto de nosso vizinho sul-americano seja necessariamente melhor. Devido ao clima e solo do pais, a Colômbia produz um café mais ácido. Mas uma boa estratégia de marketing transformou o que poderia ser percebido como defeito em diferencial do produto e qualidade.

Segundo a Revista Globo Rural, em 2014 uma saca de 60kg de café brasileiro era vendida a USD 152, enquanto a do café colombiano valia USD 195.

Marcas brasileiras de sucesso no exterior

Obviamente existem marcas brasileiras que são reconhecidas como sinônimo de qualidade no exterior, como a EMBRAER e as sandálias Havaianas, da Alpargatas.

A EMBRAER era uma empresa estatal fabricante de aviões que ao ser privatizada, investiu na qualidade de seus projetos e ocupou com produtos muito competitivos nichos da aviação civil e militar. Entre seus cases de sucesso estão o jato comercial de Embrar ERJ 145, com configurações possíveis de 37 a 50 passageiros, o turboélice militar de treinamento e ataque leve Embraer EMB-314 – Super Tucano e mais recentemente o cargueiro militar KC – 390, rebatizado de C 390 após a fusão com a Boeing, que revolucionou um mercado que era dominado pelo cargueiro Hercules C-130, da Lockheed Martin desde 1954.

Se a EMBRAER é um caso de empresa que trabalha com vendas B2B e de compras governamentais, de equipamentos de defesa, onde as decisões técnicas e financeiras têm muito mais peso que a força das marcas, não é o caso das Havaianas. Além de protagonizar um dos mais célebres cases de reposicionamento de marca dentro do mercado brasileiro, as Havaianas se tornaram um ícone fashion mundial, usadas por celebridades e com lojas físicas em pontos comerciais tão prestigiados quanto Disney Springs, no Complexo Disney em Orlando, Flórida, EUA, o Boulevard Saint-Martin em Paris, França, e Westfield London, no Reino Unido.

Esses são dois cases de sucesso dos quais os brasileiros, sem dúvida, têm razões para se orgulhar. O problema é que, como dizem, “uma andorinha só não faz verão”. Não existe, pelo menos por enquanto, uma percepção mundial de valor, e consequentemente uma demanda, por engenharia aeroespacial ou sandálias de borracha brasileiras, como existe por vinhos chilenos, perfumes franceses, chocolates suíços ou cervejas belgas.

Oportunidades de criar uma marca Brasil

O fato de ainda não existir uma marca Brasil criada de forma orgânica não significa que investir em branding não seja um caminho que setores da economia brasileira não devam tomar. Muito pelo contrário. Carne bovina, carne de frango e calçados são exemplos de produtos em que temos qualidade, custos muito competitivos e profissionais competentes em todas as fases da cadeia produtiva.

Todos esses setores, entre outros, poderiam se beneficiar muito de um trabalho de branding em conjunto, seguindo o exemplo do café colombiano, para que o carimbo do Made In Brazil agregue valor a cada peça vendida. Fica a dica para as empresas e associações de classe.

 

internacionalização de empresas 2.0

Internacionalização de empresas 2.0: como se adaptar ao mundo pós-coronavírus.

O mundo pós-coronavírus apresentará realidades diferentes das anteriores para as empresas brasileiras. Haverá mudanças profundas nos cenários mundial, latino-americano e no próprio comportamento do consumidor. À adaptação de seus processos e estratégias para se manterem eficientes, competitivas e principalmente lucrativas, chamamos de internacionalização 2.0.

O que é a internacionalização de empresas

Conceitualmente, internacionalizar uma empresa significa adaptar seus processos e ampliar as atividades para interagir com empresas e consumidores de outros países através de exportação de produtos ou serviços, abertura de escritórios, lojas e franquias no exterior, e finalmente, ter uma marca reconhecida e valorizada pelos consumidores nesses mercados.

Para o mercado interno, uma empresa se internacionaliza através da importação de produtos, serviços ou know how, participando de cadeias de valor ou criando uma linha de produção parcial ou totalmente fora do Brasil, mas que tenha seu ponto de maior adição de valor em nosso país, e que permita a ela competir em condições de igualdade ou superioridade no mercado doméstico, inclusive contra concorrentes estrangeiros.

Vantagens da internacionalização

Quando passam por um processo de internacionalização, um dos primeiros ganhos que as empresas brasileiras têm é uma racionalização de processos e redução de custos. Para as que exportam, além dos incentivos fiscais e financeiros, existe muitas vezes a obrigação da adoção de novas tecnologias, que em outra situação, talvez fosse postergada.

A adoção de tecnologia de ponta por parte das empresas estrangeiras faz parte do esforço para adequar produtos e serviços aos padrões dos consumidores de outros países, que podem inclusive já ter um nível de exigência superior ao brasileiro. A melhoria de qualidade acaba sendo trazida também para o mercado interno, fazendo com que a empresa que se internacionaliza seja mais competitiva também no Brasil.

Além dos ganhos em competitividade, existe a questão da percepção de valor por parte do consumidor brasileiro, que historicamente considera melhores os produtos brasileiros valorizados também no exterior, como é o caso das sandálias havaianas, cujo processo de internacionalização e inserção no mercado internacional ajudou a consolidar o reposicionamento da marca no mercado brasileiro.

Outra grande vantagem da internacionalização de empresas é a diluição de riscos por atuar em vários mercados. A crise do coronavírus é um caso raro de crise ‘universal’ que atingiu o mundo inteiro simultaneamente. Em crises anteriores,  ‘normais’, empresas internacionalizadas se mostraram menos vulneráveis a seus efeitos, porque nem todos os mercados em que atuavam foram atingidos com a mesma intensidade.

Finalmente, há o fator humano.  Os profissionais das empresas brasileiras que se internacionalizam têm contato com profissionais,  metodologias de trabalho e culturas estrangeiras, que adicionam experiências e agregam valor aos seus currículos, funcionando como uma espécie de bônus sociocultural, que ajuda as empresas internacionalizadas a atrair e reter talentos.

O que é a internacionalização 2.0

Internacionalização 2.0 é a série de competências adicionais que as empresas brasileiras precisarão ter, para iniciar, ou completar seu processo de internacionalização e serem competitivas no mundo pós-pandemia.

Essas competências são relativas a cenários que a Covid-19 está criando no Brasil e em vários países do mundo, causando a reversão de algumas tendências que pareciam consolidadas e a aceleração de outras cuja consolidação estava sendo atrasada por fatores culturais e comportamentais, e podem significar ameaças ou oportunidades para as empresas brasileiras.

Logística e armazenamento: Do Just in time para o Just in case.

Ao longo de décadas as empresas do mundo inteiro foram adaptando seus sistemas logísticos e de abastecimento ao sistema just in time, trabalhando com estoques mínimos para diminuir custos e ter uma produção mais flexível. Esse era o caso, no Brasil, de setores dependentes de importações, como equipamentos médicos, farmacêuticos, eletrônicos, automobilístico e de autopeças.

A crise da Covid-19 e a crescente rivalidade entre Estados Unidos e China colocaram a confiabilidade de muitas dessas cadeias logísticas em xeque, fazendo com que muitas empresas redefinam suas estratégias de logística e armazenamento, investindo em estoques.

Essa é uma tendência que já se apresentou com força no agronegócio brasileiro, que mesmo com as estimativas de que o comércio mundial irá cair por volta de 30% em 2020, em maio aumentou suas vendas para o exterior em 2,8% (em toneladas de produtos). É uma boa notícia? Depende do ângulo em que se analisa.

Embora esse crescimento tenha ajudado a manter o saldo comercial brasileiro positivo, tudo indica que não se trata de um aumento, mas de uma antecipação de consumo para formação de estoque, principalmente por parte da China, que em abril de 2020 absorveu 37% de nossas exportações, talvez por receio de que, pelos efeitos da pandemia, o Brasil fique impossibilitado de entregar encomendas futuras.

Migrar do sistema just in time para o just in case, em que estoques mais volumosos são mantidos para garantir uma continuidade operacional em caso de falhas de logística tem seus custos, sendo o primeiro deles o armazenamento. Empresas que tiverem essa capacidade a custos baixos terão um diferencial competitivo. E as que puderem fornecer esse serviço às que não tem por um preço competitivo, terão oportunidades de negócio.

 

Tecnologia adaptada às mudanças comportamentais

Internet das coisas, robótica, inteligência artificial, e-commerce e a comunicação por internet com transmissão de som e vídeo ao vivo, em tempo real, estão muito longe de serem novidades. Mas, por causa da pandemia de coronavírus, as pessoas foram obrigadas a literalmente abraçar a mudança, aderindo às inovações às quais antes resistiam por questões culturais e comportamentais.

Consumidores que não tinham o costume de comprar pela internet viram nos e-commerces a única maneira de suprir suas necessidades. Instituições de ensino que antes utilizavam somente as aulas presenciais se viram obrigadas a aderir ao EAD (Ensino à Distância) para manter suas atividades, assim como os alunos, de todas as idades e graus de escolaridade estão sendo obrigados a se acostumar a essa modalidade.

Diretamente relacionadas às empresas internacionalizadas, as viagens ao exterior, missões empresariais e feiras de negócios estraram em um hiato. Todos os negócios que dependem de reunir pessoas em um mesmo espaço, de um voo internacional a um pavilhão de exposições, só poderão ser plenamente retomados após a descoberta de uma vacina eficiente e da imunização de bilhões de pessoas.

Outra subdivisão do ramo de eventos, a indústria do entretenimento, que também foi severamente afetada pela isolamento social, encontrou nas lives como uma maneira de manter suas marcas relevantes para o seu público. As feiras e exposições de negócios também devem adotar esse formato, que será o novo normal enquanto não houver uma maneira de voltar a reunir pessoas com segurança.

Será um imenso diferencial competitivo das empresas internacionalizadas 2.0 entender as limitações, mas também as imensas potencialidades desse formato de comunicação para exportar e importar, descobrir e qualificar novos fornecedores, abrir novos mercados e prospectar clientes para seus produtos. Dentro do novo normal, essas serão as novas formas das marcas se comunicarem com o seu público.

Novos hábitos dos consumidores

Finalmente, a empresa internacionalizada 2.0 precisará conhecer muito bem quem serão os seus consumidores, porque a disputa por mercados será visceral. Todos os concorrentes internacionais que dependiam da cadeia de valor globalizada e centralizada na China tendem a perder muito espaço no mercado norte-americano, que é o maior para praticamente tudo.

Esses concorrentes certamente buscarão novos mercados para compensar essa perda, competindo com as empresas brasileiras nos mercados externos que elas tentarem abrir e no próprio mercado interno brasileiro, independentemente das condições da nossa economia.

Para ter sucesso em um mercado estrangeiro, obviamente são necessários os acordos bilaterais  entre os países e blocos comerciais, para permitir a exportação e importação de produtos e serviços entre eles. Mas o que vai caracterizar as empresas internacionalizadas 2.0 será entender que ter preços competitivos é apenas um dos fatores que as levará ao sucesso nesses novos mercados. Porque a escolha de compra é do consumidor.

E quem é esse consumidor pós-pandemia? Pesquisas apontam que é um consumidor  que, durante a pandemia, por ter perdido renda, ou pelo medo de perdê-la, além de ter aumentado suas compras online, se tornou menos fiel às marcas que consumia, buscando opções mais em conta. Um comportamento que gerou ameaças às marcas estabelecidas  e oportunidades às marcas entrantes.

Mas o preço não é a única variante que os consumidores levaram em conta. As pessoas percebem cada vez mais valor em marcas que têm propósito, que estão de alguma maneira engajadas em causas socialmente relevantes, como por exemplo, a ética e transparência, garantidas pela boa governança e a sustentabilidade ambiental.

Os consumidores esperam das marcas mais do que elas simplesmente seguirem a legislação ambiental, mas ações e posicionamentos a favor de causas como a sustentabilidade ambiental, porque ao consumir os produtos dessas marcas, eles se sentem vinculados a essas causas.

E da mesma maneira que espera sentir uma espécie de orgulho por consumir marcas que têm os posicionamentos que considera corretos, esse novo consumidor pode se sentir envergonhado de marcas envolvidas em situações socialmente reprováveis, como por exemplo, fraudes e casos de corrupção.

Resumindo, as pessoas exigem das marcas que consomem transparência, ética , ações que promovam a sustentabilidade e principalmente, posicionamentos inequívocos a respeito de tudo isso.

Saiba mais sobre internacionalização de empresas aqui

Internacionalização de empresas no mundo pós-coronavírus

Internacionalização será fundamental para empresas brasileiras no mundo pós-coronavírus

Uma das maiores dúvidas dos gestores das organizações é entender como será o mundo pós-coronavírus , e o que devem fazer para se adaptar a ele. Para cada país haverá desafios diferentes, mas há razões para crer que, para as empresas brasileiras, a internacionalização será fundamental, mesmo que a tendência que parece estar se concretizando seja a de um mundo menos globalizado.

Embora internacionalizar para ser mais competitivo em um contexto de antiglobalização pareça ser um contrassenso em si, esse é um dos paradoxos que a covid-19 parece criar para o mundo que existirá depois dela, e está diretamente relacionada à escassez de respiradores e à posição da China como a grande fábrica do mundo.

Uma parte da tragédia dessa pandemia está na natureza do microrganismo. Uma mutação de um vírus conhecido, que por razões que os cientistas estão ainda buscando, se tornou mais letal e muito mais contagiosa, contaminou um cidadão chinês, e se espalhou rapidamente pelos cinco continentes. A devastação causada é algo que o mundo não via desde a chamada gripe espanhola, há mais de 100 anos.

O que precisa ficar claro é que se espalhar faz parte da natureza das epidemias, como podem comprovar os registros históricos de todas as que foram estudadas, e que um vírus não reconhece etnias, nacionalidades ou fronteiras. Querer atribuir ao novo coronavirus um ‘passaporte’ é algo que só dificulta a desejável cooperação internacional para combatê-lo.

Porque faltam respiradores.

O que tornou a Covid-19 tão letal não foi a falta do conhecimento de como tratar os doentes, mas a escassez mundial de aparelhos respiradores e equipamentos de proteção individual como máscaras, toucas e aventais. Inclusive para os profissionais de saúde, que em meio ao caos se viram sem o mínimo de condições de trabalho. Muitos se infectaram e destes, vários morreram. Uma tragédia dentro de outra.

Mas esses equipamentos não eram escassos por serem caros. Justamente o contrário. Para os padrões de suas indústrias, eles eram tão baratos que 90% de sua produção mundial foi concentrada na China, que ao longo de décadas de um planejamento admirável, montou cadeias de produção em que não só as fábricas de cada equipamento, mas de seus componentes, estavam lá ou em países vizinhos.

A ‘tempestade perfeita’ que devastou o mundo aconteceu, também, porque o primeiro país que foi atingido foi justamente o que produzia esses equipamentos. E se tornou totalmente impossível produzir e entregar, nos cinco continentes, mercadorias cuja demanda simplesmente explodiu repentinamente.

EUA X China

O novo coronavirus, entretanto, não é o único causador das mudanças no que conhecemos como globalização. Aparentemente, a pandemia acelerou uma tendência que já se apresentava, de relações mais tensas entre Estados Unidos e China, devido à disposição do país asiático de disputar com os norte-americanos a posição de maior potência econômica, militar e científica do mundo.

Diante do desafio aberto do gigante asiático, expresso no programa Made in China 2025,  a Casa Branca tem usado sua influência para frear o avanço chinês, com ações que vão desde o acordo comercial EUA X China a estímulos para que marcas norte-americanas parem de produzir na China e fundos de investimento não invistam em companhias chinesas.

Qual será o resultado dessa disputa de gigantes, somada às fragilidades da atual cadeia de produção mundial, expostas pela pandemia, ninguém sabe. O que parece certo é que as empresas de todos os países, inclusive do Brasil, devem se preparar para um cenário completamente novo.

O mundo pós-Covid-19 não será aquele desejado pelos críticos da globalização

Antes da pandemia, a grande maioria das críticas à globalização, e ao livre-comércio entre os países, se baseava no argumento de que países em que os custos de produção são mais baixos atraem as fábricas de diversos tipos de manufaturas, e que por isso, “roubam os empregos” de operários de países onde os custos de produção são mais altos, por fatores diversos. E o padrão de vida desses operários, e de suas famílias, cai.

Esse fato foi explorado de todos os lados do espectro ideológico. Tanto ativistas políticos anticapitalistas, quanto empresários incomodados com a concorrência de produtos estrangeiros, já usaram o argumento dos empregos para criticar a globalização e pressionar seus governos por medidas protecionistas.

Mas, apesar de a tendência indicar um mundo com mais protecionismo do que havia antes da Covid-19, se engana quem acredita que os principais países do mundo irão fechar suas economias, limitando importações e substituindo-as por produtos nacionais. Essas foram experiências pela qual países como o Brasil e  Argentina e Índia já passaram, e não ajudou a criar indústrias competitivas e consumidores bem atendidos.

Internacionalização tornará as empresas brasileiras mais competitivas.

Se existe uma tendência mundial protecionista, por que internacionalizar as empresas brasileiras, adaptando seus processos produtivo, administrativo, fiscal e tributário, além de relações com clientes, fornecedores e prestadores de serviço a padrões internacionais, tornando-as aptas a importar, exportar e ter filiais, escritórios  parceiros no exterior?

A resposta poderia ser porque isso as tornará mais competitivas. E ser competitivo em um cenário extremamente recessivo, como o que as empresas brasileiras vão encontrar na retomada das atividades, pode ser decisivo para a sua continuidade. Mas como já vimos, mesmo quando o mundo sair da recessão, os fatores que listamos no início desse texto criarão novos cenários, que podem inclusive se manifestar simultaneamente.

Menos globalização e mais regionalização continental

A falta de respiradores escancarou a fragilidade das cadeias de valor concentradas na China. Mas experiências anteriores de nacionalização total da produção de manufaturados também não foram bem sucedidas, porque mesmo um país com uma indústria diversificada, como o Brasil, jamais conseguiu ser competitivo em todas elas, que só sobreviviam sendo protegidas da concorrência internacional.

Um cenário possível nessa situação será a criação de novas cadeias produtivas regionalizadas, com cada etapa delas instalada no país do continente que for mais competitivo para ela. Isso não significará que as economias do mundo, com exceção da norte-americana, terão um viés anti-China. É muito provável, inclusive, que investidores chineses sejam convidados a participar.

Mas o que ninguém vai querer passar novamente é pela situação de precisar desesperadamente de uma mercadoria, ter o dinheiro para comprá-la e não conseguir, porque somente um país do mundo é capaz de produzir e entregar. E o mundo inteiro está na fila.

Mercado externo mais competitivo.

Um dos cenários possíveis para as empresas brasileiras é que, na retomada elas encontrem um mercado interno tão recessivo que acreditem ser esse um bom momento para buscar clientes no mercado externo. É uma excelente estratégia, e que pode e deve ser mantida, pois empresas internacionalizadas tendem a ser mais estáveis no longo prazo, podendo contar com o exterior quando o mercado doméstico está em baixa.

Mas não só elas podem ter essa ideia, mas seus concorrentes de outros países. Para conseguir competir com eles, além de todos os processos internacionalizados, as empresas brasileiras deverão ter produtos adaptados aos gostos e preferências dos consumidores de cada país para o qual quiserem exportar.

Novos competidores no mercado brasileiro.

Mesmo que as empresas brasileiras não queiram, precisem ou possam buscar o mercado externo, a internacionalização pode ser muito necessária. Em um mundo mais protecionista, grandes empresas exportadoras, como por exemplo, as chinesas, podem olhar para o mercado brasileiro, e seus 200 milhões de habitantes, como uma maneira de compensar os consumidores que podem perder no mercado americano.

A internacionalização pode tornar as empresas brasileiras mais competitivas para defender a sua participação no mercado doméstico, tendo não somente um processo produtivo competitivo em termos de custo, como produtos com a mesma qualidade dos competidores estrangeiros, pois com mercado recessivo, ou não, o consumidor será ainda mais exigente em termos de qualidade dos produtos que compra.

combate ao coronavirus

Falta de cooperação internacional prejudica combate ao coronavírus

A crise do coronavirus está causando imensos prejuízos a todas as economias do mundo. Mas, além das perdas humanas e econômicas, o mundo globalizado que conhecíamos pode ser mais uma das vítimas fatais da pandemia. E isso não se deve somente à ação do vírus, mas a uma falta de cooperação internacional que se deve à visão de mundo de líderes populistas, que antecede o Covid-19, e a crise sanitária exacerbou.

A falta de confiança reina em todos os países, e a pandemia parece ter instalado uma espécie  de “lei da selva”. Além das proibições várias de exportações de produtos médicos e alimentares, vemos países tentarem comprar equipamentos médicos e não conseguirem, porque outros cobrem a oferta, desfazendo contratos fechados, ou simplesmente confiscam os equipamentos.

A disputa entre as grandes potências mundiais por influência política e econômica é um processo normal, que existe desde que se constituíram os Estados nacionais. Mas ao longo da história, muitas vezes pôde-se observar rivais históricos deixarem suas desavenças de lado para enfrentarem ameaças em comum, como observamos quando Estados Unidos e Rússia cooperaram para combater a pandemia do vírus Ebola, na África, com excelentes resultados.

Não é o que estamos vendo nesse momento. Além de os sistemas de cooperação internacional que poderiam  facilitar os tratamentos e acelerar a descoberta de uma vacina para a Covid-19,  para que o mundo possa retomar sua normalidade, vemos o combate ao novo coronavírus ser envolvido por governantes populistas em uma narrativa de confronto político, que em nada ajuda a busca do objetivo comum.

Entre essas disputas envolvidas em narrativas, está a entre os Estados Unidos e a China, que mais do que trazer prejuízos circunstanciais para o comércio mundial, coloca em xeque as próprias regras que regeram esse comércio até hoje ,e permitiram a globalização econômica,  na medida que a legitimidade de organizações multilaterais como a OMC – Organização Mundial do Comércio, são colocadas em dúvida.

Os organismos multilaterais não são infalíveis.  A própria OMS – Organização Mundial da Saúde, que tem estado no centro das atenções durante a crise do coronavírus, aceitou uma investigação independente sobre suas ações desde o início da pandemia. Mas quando se abre mão delas, se renuncia também a uma instância com credibilidade e autoridade para arbitrar as disputas comerciais entre países com base em regras aceitas por todos.

Sem esses organismos multilaterais de cooperação internacional,  a resolução de disputas comerciais entre países, que acontecem com frequência, dependerá de negociações entre as duas partes, que na falta de um acordo,  podem simplesmente resultar em sanções e mais protecionismo, algo que já será uma tendência natural do mundo pós-pandemia, depois que a crise dos respiradores mostrou os problemas de a China ser a grande fábrica do mundo.

Made in China 2025 é como o gigante asiático pretende se apresentar ao mundo.

Quem observa a geopolítica do mundo nos últimos 20 anos percebe que desde 2009, quando a Crise do Subprime causou uma grave recessão nos Estados Unidos, a China parece ter assumido o papel de locomotiva econômica do mundo, quando inclusive se tornou o principal destino das exportações brasileiras.

Mas a China há muito trabalha para deixar de ser somente a fábrica de manufaturas baratas para marcas de outros países. O gigante asiático tem uma estratégia definida para se tornar a maior economia e o grande poder político e militar do mundo, rivalizando com os Estados Unidos, que ocupam essa posição desde o fim da Segunda Guerra Mundial. E parece ter condições para isso.

A estratégia chinesa de rivalizar abertamente com os Estados Unidos ficou evidente em 2015, com o lançamento do Programa Made in China 2025. O programa conta com cerca de 10 pontos principais, visando alavancar o crescimento tecnológico em setores como semicondutores, engenharia de hardwares e softwares, redes de telecomunicações, automóveis e engenharia genética.

O programa se baseia na atratividade do enorme mercado chinês e na legislação do país, que obriga as empresas estrangeiras que se estabelecerem lá a se associarem às empresas chinesas e na estratégia de privilegiar empresas campeãs nacionais, que hoje competem globalmente, como Huawei (equipamentos de telecomunicação), Baidu (inteligência artificial), e Alibaba (e-commerce), entre outras.

Outro ponto a destacar no Made in China 2025 é que o governo chinês se concentrará na qualidade do crescimento e não na quantidade. Ou seja, o objetivo é o desenvolvimento de alta tecnologia e de produtos com grande valor agregado, resultando na criação de marcas chinesas globais, como já está, de fato, acontecendo.

A reação dos Estados Unidos ao Made in  China 2025.

O Presidente americano define o programa chinês como um roubo de tecnologia que ameaça a segurança nacional e a livre concorrência. A pandemia tem sido usada para intensificar a ofensiva retórica e demonizar a China, havendo, inclusive, autoridades americanas afirmando que hackers chineses estão tentando roubar pesquisas médicas para piratear os estudos científicos que buscam obter a vacina contra o Covid-19.

Essa retorica do governo americano explora politicamente um sentimento anti-China de parte da população do país. Há desde projetos no Senado americano de adotar uma legislação impondo sanções às autoridades chinesas por violação de direitos humanos contra as minorias muçulmanas em Xinjiang, a movimentações da Casa Branca para bloquear os investimentos de fundos de pensão americanos em ações de companhias chinesas.

Saindo do campo doméstico, a Casa Branca pretende incentivar as empresas norte-americanas que estão na China a produzirem nos EUA, principalmente equipamentos eletrônicos e da área médica. E não está sozinha na iniciativa. O Japão, outro país que tem um histórico problemático com a China, ofereceu incentivos para as indústrias japonesas instaladas lá retirarem suas instalações do país, diminuindo a alta dependência em alguns setores de atividades.

 

O dragão mostra suas garras.

Pequim já deu sinais de que não pretende apanhar calada. O governo chinês estuda a possibilidade de anular ou renegociar o acordo comercial com os Estados Unidos, em função das críticas norte-americanas à maneira como país asiático lidou com a pandemia, indicando que a chamada mentalidade chinesa de resultados em relação ao Ocidente, a convicção de que precisam compreender e relevar a hostilidade dos EUA e de outros países tem perdido espaço.

Um exemplo dessa nova política nas relações internacionais aconteceu com a Austrália, outro país cujo governo tem criticado o gigante asiático com frequência. A China desabilitou quatro frigoríficos australianos como fornecedores de carnes, além de proibir à importação de cevada do país. E se engana quem pensa que Pequim quis apenas passar um recado.

A partir de junho de 2020, a China exigirá das operadoras de infraestrutura pública, como empresas de telecomunicações e transporte, que submetam ao governo uma avaliação de segurança de seus fornecedores ao contratar servidores e outros equipamentos de tecnologia da informação (TI). Essa exigência visa evitar interrupções no fornecimento de equipamentos como resultado de eventuais acontecimentos políticos e diplomáticos. Como resultado, companhias estrangeiras poderão ficar de fora dos processos de compras governamentais.

EUA x China, qual deve ser a política governamental e empresarial brasileira

O aumento do protecionismo e da rivalidade China x EUA é uma disputa por poder e influência entre a maior potência econômica, militar e científica do mundo e uma potência ascendente, que mostra ter condições para levar essa rivalidade à frente, como nenhum outro país já demonstrou no passado. Ambos os países, além de manterem relações historicamente boas com o Brasil, são os seus dois maiores parceiros comerciais.

Entretanto, para as empresas e o governo brasileiros, há mais a fazer do que simplesmente ficar de fora da briga dos dois gigantes e lamentar o aumento do protecionismo comercial. O Brasil pode aproveitar as mudanças nas cadeias globais de produção trazidas pelo desejo de segurança e se posicionar como um provedor seguro e confiável. E não somente no mercado de alimentos, onde já somos muito competitivos.

Além do agronegócio, existem outros mercados onde o Brasil pode ser muito competitivo e gerar muitos empregos, como o setor de insumos e equipamentos de saúde e até a indústria farmacêutica. Para isso, há necessidade de definir uma nova política industrial, com a formação de cadeias estratégicas e uma política sanitária que privilegie a segurança alimentar.

Os empresários brasileiros não devem, entretanto, acreditar que um mundo menos globalizado levará a uma economia brasileira mais fechada e protegida. Os desafios do novo modelo de globalização, ou antiglobalização, incluirão severas restrições de formação das cadeias globais de produção e de serviços.

As empresas brasileiras devem se internacionalizar, se preparando tanto para a competição externa pelo mercado brasileiro como para disputar com agressividade, e técnicas avançadas de marketing, os mercados dos nossos principais parceiros comerciais.

Investindo na crise

Fundos de investimento dos países árabes vão às compras na crise do coronavírus

 

A pandemia do coronavírus causou prejuízos no mundo inteiro, e consequentemente, a desvalorização das ações das empresas negociadas em bolsas de valores. Esse é o momento em que os grandes investidores vão às compras, geralmente buscando empresas e mercados que eles acreditam que recuperarão sua lucratividade e valor quando a crise terminar e retomarem suas atividades normais.

Esse é o caso dos fundos soberanos dos países árabes, que estão aproveitando os preços baixos para ir às compras, aumentando sua participação em empresas dos quais já detinham ações e também fazendo negócios de ocasião nas mais variadas áreas como petróleo, turismo, medicina, tecnologia, logística e até mesmo esporte e entretenimento.

Como os fundos soberanos investem na crise do coronavírus

Dizer que crise é outra palavra para oportunidade, ou que ambas são dois lados da mesma moeda é um chavão repetido com frequência, inclusive por investidores. O mais apropriado, entretanto, seria dizer que a crise de um é a oportunidade de outro, mais bem preparado para o momento.

O conceito ainda é válido, mas como a situação atual é diferente de todas as turbulências econômicas anteriores, ele deve ser aplicado com ressalvas para entender a estratégia de aquisição dos fundos de investimento soberanos dos países do Golfo Arábico durante a crise do coronavirus.

Em crises econômicas anteriores, sempre havia países extremamente afetados, que se tornavam cenários de oportunidades para investidores capitalizados, de países em um contexto mais favorável, adquirissem uma parte, ou até mesmo o controle acionário, de empresas com potencial de lucro, mas cujas ações estavam em um momento de baixa.

Esse foi o caso em 2008, quando a chamada Crise do Subprime foi o estopim para o início de uma profunda recessão nos Estados Unidos, que criou oportunidades para que investidores de outros países, como os brasileiros Jorge Paulo LemannMarcel Herrmann Telles e Carlos Alberto Sicupira, da 3G Capital, adquirissem o controle acionário de marcas icônicas como o Burger King e o Ketchup Heinz.

Quando o Brasil entrou em crise, a partir de 2014, setores que antes haviam experimentado uma forte valorização, como o mercado imobiliário, se tornaram um celeiro de oportunidades para investidores estrangeiros. Esse foi o caso do Fundo Brookfield, do Canadá, que entre 2013 e 2018, aportou mais de 27 bilhões de reais em investimentos no Brasil, inclusive em imóveis comerciais.

Porque a crise do coronavírus é diferente.

A crise atual é diferente porque a pandemia atingiu praticamente todos os países do mundo, quase ao mesmo tempo, fazendo com que mesmo os grandes fundos de investimento, mais capitalizados, sejam mais cuidadosos com seus investimentos. No caso dos fundos soberanos dos países árabes, a indústria do petróleo, que é sua grande fonte de recursos, foi severamente afetada, como nunca se viu antes.

Outro ponto é que essa crise terá um timing diferente das anteriores, descritas na teoria dos ciclos econômicos de John Maynard Keynes. A retomada, que levará ao lucro que os investidores esperam, dependerá do timing do vírus. De a ciência desenvolver uma droga eficiente para tratar a doença, descobrir uma vacina contra a Covid-19 e, assim que isso acontecer, de se imunizar populações inteiras em vários países.

Enquanto isso não acontecer, todos terão de se acostumar a um novo normal, que influenciará a maneira como as empresas organizam sua produção, logística, estratégias de marketing e vendas.

Então, por causa de tantos fatores de incerteza, os gestores dos fundos soberanos têm trabalhado com os bancos de investimento à procura de empresas com valores subestimados, para minimizar o tamanho dos investimentos, e consequentemente, os seus riscos.

Vamos analisar os movimentos de alguns dos principais.

 

Public Investment Fund – Arábia Saudita

O Fundo de Investimento Público da Arábia Saudita , ligado ao SAMA, foi às compras de maneira agressiva, aumentando a participação, ou até adquirindo o controle, de empresas de setores tradicionais, cujo valor despencou por seus negócios dependerem diretamente de aglomeração ou movimentação de pessoas. As empresas são as seguintes:

Petrolíferas

Repsol

Royal Dutch Shell

Equinor

Eni

Turismo, esportes e entretenimento

O turismo, os esportes, os shows e eventos estão entre os setores que mais sofreram com a crise do coronavírus, porque criar aglomerações está na alma e no propósito desses negócios. Foram cancelados ou adiados os principais eventos esportivos do mundo, como todos os torneios de futebol, os Jogos Olímpicos de Tóquio, as turnês dos principais artistas e praticamente todas as viagens de lazer.

Nesse cenário, o Public Investment Fund saudita fez as seguintes aquisições:

Carnival Cruises – Maior operadora de cruzeiros marítimos do mundo. O valor das ações da gigante do turismo caíram mais de 80%. Aproveitando a oportunidade, o Fundo Público Saudita adquiriu 8,2% das ações.

Newcastle United Football Club– Clube da primeira divisão do futebol inglês. O fundo saudita pagou US$ 413 milhões, ou 343 milhões de Euros por 80% das ações, o que torna o PIF sócio majoritário do clube. Segundo a imprensa especializada, o príncipe herdeiro saudita, Mohamed Bin Salman, deverá acompanhar de perto a administração do clube inglês.

Live Nation – o PIF adquiriu entre 5% e 7% das ações da promotora e operadora de eventos que conta em seu portfólio com as turnês de artistas do porte de Madonna, Metallica, U2 e Lady Gaga. Em troca do investimento o fundo saudita investiu Us$ 500 milhões.

 

Por outro lado, o PIF também investiu em empresas cujo valor deve aumentar no mundo pós coronavírus, como assistência médica via telemedicina, tecnologia e logística.

Entretanto, o Public Investment Fund está altamente comprometido, pois além do déficit fiscal, agravado pela queda dos preços do petróleo, investe em uma série de projetos para impulsionar a atividade econômica dentro da própria Arábia Saudita, como o Saudi Vision 2030.

Especialistas avaliam que parte desses projetos pode ser adiada ou suspensa, uma vez que Riad será obrigada a reduzir gastos para manter subsídios diversos e garantir o bem-estar da população afetada pela pandemia.

 

Fundo de Investimento Mubadala – Emirados Árabes Unidos.

O Fundo Mubadala foi mais agressivo, investindo no que acredita serem tendências do futuro, como um peso ainda maior da China na economia global, adquirindo participação, ou aumentando, em empresas daquele país em setores diversos.

Em mercados mais tradicionais, como Estados Unidos e Europa, também investiu em empresas de tecnologia de ponta, como farmacêuticas e medicina.

O Fundo Mubadala começou o ano de 2021 apostando no Brasil, e no setor de refino de petróleo, sendo o vencedor do leilão pela Refinaria Landulpho Alves (Rlam), da Petrobrás, na Bahia. A oferta vencedora do Mubadala foi de US$ 1,65 bilhão de dólares, equivalentes a R$8,87 bilhões em valores da data da aquisição, 8 de fevereiro de 2021

Fundo Soberano do Catar – Qatar Investment Authority

A Autoridade de Investimentos do Qatar, que conta atualmente com recursos de US$320 bilhões, está aumentando sua participação em investimentos na Ásia e América do Norte, e desde 2019 montou uma equipe especializada em participações diretas em empresas de mercados emergentes como a América Latina, África e Ásia.

Fundo de Investimento de Abu Dhabi, EAU – Abu Dhabi Investment Authority (ADIA)

O ADIA, maior fundo de investimentos de Abu Dhabi, com ativos entre US$ 700 a 800 bilhões, em valores atualizados, ainda não se movimentou. Está aguardando os pedidos dos dirigentes dos Emirados Árabes Unidos para suprir as necessidades governamentais, tais como garantir a liquidez a emirados menos ricos.

Entretanto, espera-se que o fundo soberano dos Emirados Árabes ainda faça investimentos, e a razão de não ter feito ainda é estar buscando ativos com preços desvalorizados pelo mundo.

Quais as chances de o Brasil atrair investimentos desses fundos soberanos

Fundos como o Mubadala e o Qatar Investment Authority já tem atuação no nosso país, mas como destino de investimentos, o Brasil envia sinais dúbios.

Por um lado, o Brasil é um país de mais de 200 milhões de habitantes, uma das 10 maiores economias do mundo e muito a se desenvolver, nos mais diversos setores, o que por si só deveria ser uma isca irresistível para os fundos de investimento. Além desse fator, que podemos considerar uma constante, o momento atual é extremamente propício aos investidores capitalizados, pois a cotação Real x Dólar torna o Brasil um investimento barato.

Entretanto, existem os fatores de incerteza que afastam os investidores do Brasil que também são constantes nessa equação, como a insegurança jurídica. A essa falta de um arcabouço legal mais sólido de proteção ao investimento estrangeiro, se soma o fator circunstancial da instabilidade política. Tão importante quanto ter regras claras e amigáveis aos investidores, é preciso ter certeza de que essas regras são constantes e invioláveis.

Como atrair os investimentos dos fundos soberanos.

Muitos fundos de investimento ainda têm uma percepção de risco muito alta em relação ao Brasil, especialmente quando comparado a mercados mais tradicionais, como os países da Europa e América do Norte, ou mesmo o Chile. Falando um português mais claro, esses investidores ainda enxergam no Brasil uma “arapuca”, um destino exótico, onde a possibilidade de lucro depende de um conhecimento sobre leis, práticas e costumes locais que são incompreensíveis para quem é de fora.

Essa percepção é bastante exagerada, pois existem cases de sucesso. O já citado Fundo Brookfield atua no Brasil desde 1899,  tendo sido o responsável pelos primeiros projetos de iluminação pública e transporte coletivo elétricos no país, os famosos bondes. Ha menos tempo no Brasil, mas bastante agressivo em seus investimentos, o Qatar Investment Authority atua nas áreas de transporte aéreo, bancos, agricultura, petróleo, gás, editorial e educativo.

Como o Estado brasileiro pode ajudar a atrair os fundos de investimento

Ao Estado brasileiro cabe garantir a segurança jurídica dos contratos, para que qualquer investimento, estrangeiro ou brasileiro, seja protegido, independentemente de quem seja o governante de turno e de suas inclinações políticas, nas esferas municipal, estadual e federal. Episódios como a cassação da concessão da Linha Amarela no Rio de Janeiro, por exemplo, são um grande desestímulo a quem pensa em investir no Brasil.

Além da proteção do investimento contra arroubos populistas, é importante que os contratos permitam o hedge cambial, protegendo o investimento de grandes variações da cotação da moeda brasileira em relação às estrangeiras.

Quais os setores da economia brasileira mais atraentes para os fundos de investimento

A princípio, qualquer empresa que tenha uma boa possibilidade de rentabilidade pode ser atraente para os investidores árabes, mas eles tradicionalmente têm mostrado uma preferência por projetos de agrobusiness, investimento imobiliários na área de hotéis, resorts e shopping centers e participação em joint ventures na exploração de petróleo e gás.

Como as empresas brasileiras podem atrair os fundos de investimento.

Atrair os fundos soberanos dos países árabes como investidores das empresas brasileiras é um trabalho que envolve pelo menos duas etapas. A primeira é uma auditoria adequada e, com base nos resultados, uma atualização e padronização de procedimentos, que a tornam mais apta a receber investimentos.

A segunda etapa é a prospecção e captação de investidores em si, que dependerá de um trabalho profissional e sério de apresentação e convencimento dos investidores de que o Brasil é sim uma grande oportunidade, ainda mais nesse momento.

Oportunidade pode ser, sim, o reverso da moeda da crise. Cabe aos executivos governamentais  e empresários brasileiros não deixar que ela escape.