O Qatar, ou Catar, sede da Copa do Mundo da FIFA de 2022, é um pequeno país árabe localizado na Península do Catar, no Golfo Arábico. O território do Qatar é pequeno, são apenas 11.856 km². Sua única fronteira terrestre, de 87km, é com a Arábia Saudita, sendo cercado em todo o restante pelas águas do Golfo, onde está também está seu segundo vizinho mais próximo, o Bahrein, do qual o Qatar é separado por um estreito marítimo.
O Emirado do Qatar tem chamado a atenção global já a alguns anos, não somente pela sua pujança econômica, sendo considerado pelo Fundo Monetário Internacional – FMI, como o país mais rico do mundo, mas também pela maneira como se movimenta e projeta influência na política do planeta. Por essa razão, consideramos importante que as empresas brasileiras saibam como fazer bons negócios com o Qatar.
A história do Qatar
O Qatar já foi parte do Império Otomano, participou da Revolta Árabe na época da I Guerra Mundial e se tornou parte do Império Britânico, do qual conquistou a independência formal em 1971. Até a primeira metade do Século XX, o Qatar era relativamente pobre, sendo a principal atividade econômica na península a extração de pérolas e o comércio marítimo.
O petróleo foi descoberto no Qatar em 1939, mas o início da Segunda Guerra Mundial atrasou o início da exploração e consequentemente, do enriquecimento do país. Em 1974 foi criada a Qatar General Petroleum Corporation, atualmente Qatar Petroleum, que assumiu o controle de todas as operações de petróleo. O primeiro depósito de gás natural foi descoberto em 1976, e desde então se constatou que o Qatar possui uma das maiores reservas de gás natural do mundo, e é um dos maiores exportadores desse produto.
O sistema Político do Qatar
O Qatar é um emirado com um governo absolutista e hereditário, comandado pela Casa de Thani desde o século XIX. O atual Emir do Catar é Hamad Bin Khalifa Al Thani, governante do país desde 1995, quando derrubou seu pai, Khalifa al Thani em um Golpe de Estado.
A população do Qatar
O Catar tem uma população de 2.743.901 habitantes, mas apenas 25% deles são nativos do país. O restante faz parte de um enorme contingente de trabalhadores vindos de outros países, como Índia , Nepal , Bangladesh , Paquistão , Sri Lanka , Filipinas e outros países do Sudeste Asiático.
Uma particularidade em relação a Qatar é que quase 90% da sua população se encontra em áreas urbanas, e o país é considerado também o que tem a maior proporção de homens para cada mulher no mundo. De acordo com a Qatar Statistics Authority, seriam mais de 3 homens para cada mulher.
A maior parte da população está concentrada na capital, Doha, conhecida pelo seu acelerado desenvolvimento, que tem aproximadamente 1.300.000 habitantes e fica na região leste do pais. O clima é desértico, com temperaturas altíssimas, podendo se aproximar dos 50ºC nos dias mais quentes do verão.
O IDH do Qatar
O IDH da Qatar é de 0,856, bastante alto, quando se considera que o máximo possível é 1. Para se ter uma ideia, o país com o maior IH do mundo é a Suiça, com 0,962, seguido por Noruega, com 0,961 e Islândia, com 0,959. O IDH dos Estados Unidos é de 0,921 e do Brasil é de 0,754.
A Economia do Qatar
O Qatar é atualmente um dos países mais ricos do mundo, e tem uma das menores cargas tributárias, segundo o relatório global de competitividade. Inclusive, os cidadãos não pagam impostos. Antes, um dos países mais pobres do mundo, que dependia basicamente de pesca de pérolas, o Qatar começou a enriquecer quando, em 1974, a Qatar Petroleum assumiu o controle e exploração do petróleo no país, alavancando a economia,. Segundo o Observatório da Complexidade Econômica (OEC), o Catar é a 47º maior economia de exportação do mundo.
A economia do Catar é dependente do petróleo e do gás explorados no país. O setor petrolífero responde por mais de 50% da rendimento total do Qatar. Além do país ser um dos grandes produtores de petróleo, possui a segunda maior reserva de gás do mundo.
Mas, como veremos a seguir, o Qatar, tem uma estratégia, como nação, que o torna diferente dos demais países cujas economias são totalmente dependentes do petróleo, que alguns chamam de ‘Maldição do Petróleo“.
O PIB do Qatar
Em 2019, último período antes do início da pandemia de Covid 19, o PIB do Qatar foi de 191 bilhões de dólares, sendo que o PIB per capita atingiu us$.62.088 e em termos de paridade de compra esse número sobe para us$.91.670.
Já em 2021, o PIB do Qatar subiu para 240 bilhões de dólares, o PIB percapita chegou a us$80.000,00.
Fazendo negócios no Qatar
Pelos critérios da The Economist Intelligence Unit, como ambiente de negócios o Qatar está em 27o. lugar em um ranking global que inclui 82 nações. Em termos de competitividade, ocupa o 29o posto entre 141 países, e em termos de facilidade de negócios, o 77o entre 190 países. Já em em termos de transparência, o Qatar ocupa o 30 lugar, entre 179 nações.
Exportações e importações do Qatar
Exportações
Os principais destinos das exportações do Qatar são a Coreia do Sul, Japão, Índia, China e Cingapura. Os principais produtos de exportação do país são:
Petróleo,
Petrolíferos refinados,
Polímeros de etileno
Alumínio em formas brutas.
Importações
O Qatar é um país cujo valor total em exportações costuma ser maior do que o de importações, e historicamente, costuma ter um saldo positivo em sua balança comercial. As principais origens de importação países como Reino Unido, França, Alemanha e China e os principais produtos importados pelo Qatar são:
Aviões
Helicópteros
Automóveis
Turbinas a gás
Joias.
As relações comerciais Brasil Qatar
Em 2020, o Brasil importou do Qatar o valor de USD 503,3 milhões em produtos. No ranking de importações do Brasil o Catar ocupa o 41º lugar e no de exportações, o 69o lugar. Mas, tradicionalmente, o Brasil tem um déficit em balança comercial em relação ao Qatar, que por exemplo, até abril de 2021, havia acumulado USD 130,2 milhões.
De janeiro a setembro de 2022, as exportações brasileiras para o Qatar chegaram a US$.310 milhões, sendo que as carnes de boi e de frango representaram mais de 60% , seguindo-se minério de ferro, tubos de aço perfiladas, máquinas e aparelhos eletrônicos, e há um potencial de aumento das exportações de alimentos do Brasil, pois o Qatar importa anualmente um volume de US$.580 milhões.
Quanto às importações, no mesmo período de janeiro a setembro de 2022, elas atingiram o volume de Us$.855 milhões, representados por adubos e fertilizantes, gás e produtos químicos e inorgânicos, fazendo o déficit brasileiro chegar a US$.545 milhões.
Os principais produtos do Brasil exportados para o Qatar são:
Alumina calcinada
Minério de ferro aglomerado
Carnes de frango congelada
Pedaços e miudezas de frango, congeladas
Madeiras compensadas
Madeira de coníferas serrada
Os principais produtos importados pelo Brasil do Qatar
Combustíveis
Adubos
Plásticos
Sal, enxofre, pedras, cimento
Químicos orgânicos
Oportunidades de exportação do Brasil para o Qatar
Como um mercado riquíssimo, que embora não seja grande do ponto de vista do número da habitantes, tem alguns dos consumidores de maior poder aquisitivo no planeta, o Qatar representa ainda oportunidades para os exportadores brasileiros, inclusive as pequenas e médias empresas, nos seguintes produtos
Alimentos processados
Têxteis
Calçados
Materiais de construção
Granitos e mármores
A estratégia do Qatar
Um dos fatores que chamam a atenção em relação ao Qatar é que o pais tem uma estratégia definida de projeção de influência política no mundo, independentemente do poder militar, o chamado softpower. Essa estratégia passa tanto por tentar evitar ser vítima da chamada ´‘maldição do petróleo‘‘, quanto por ter um bom trabalho de relações públicas, de divulgação da imagem do país, que poderíamos chamar de posicionamento de marca.
O que é a maldição do petróleo
Segundo estudiosos como Michael L. Ross, um país ter grandes reservas de petróleo, ou gás, como no caso do Qatar, pode ser um problema porque a exportação do produto gera tanto dinheiro que o país se torna capaz de importar praticamente tudo o que quiser, de bens de capital a bens de consumo. Segundo os adeptos dessa teoria, isso eliminaria o maior incentivo para que um país desenvolva localmente não somente indústrias, mas quaisquer atividades econômicas mais relevantes, pois importar sempre seria mais fácil e barato.
Não é nosso objetivo nos estender na análise da teoria da maldição do petróleo, inclusive em seus aspectos sociais e políticos, ou apontar onde essa teoria tem as suas falhas, visto que existem países que são grandes produtores de petróleo e são economias desenvolvidas. Mas é inegável que ela nos ajuda a incitar bons debates, mesmo que não a aceitemos como integralmente válida.
Então, com base na teoria da Maldição do Petróleo como integralmente válida, é interessante analisar a estratégia de longo prazo do Qatar para lidar com ela e não ser simplesmente um país exportador de commodities em estado bruto.
Qatar Petroleum e Qatargas
O governo do Qatar, através das companhias que pertencem ao Emirado, como Qatar Petroleum e a Qatargas, integrou outras etapas da cadeia de valor desses produtos, inclusive as de maior valor agregado, como a liquefação, que transforma o gás natural em GNL e o transporte.
A Qatargas, e suas empresas subsidiárias, são responsáveis por várias etapas da cadeia de valor do gás natural, incluindo, de forma resumida: Extração e liquefação, no próprio Qatar, que transforma a o produto em GNL, para que possa ser embarcado na sua enorme frota de navios gaseiros, que o transportam até os principais mercados do mundo, como países da Europa e China.
Em alguns casos, as próprias usinas que transformam o GNL em gás novamente, para que possa se distribuído dentro desses mercados, pertencem à Qatargas ou a uma subsidiária.
Dessa maneira, o Qatar se posiciona não como um país que exporta commodities, mas como um que exporta energia, tendo um poder de negociação muito maior do que aqueles que simplesmente exportam commodities em estado bruto.
Fundos Soberanos
Outro exemplo de como o Qatar tem uma estratégia definida é a atuação de seu fundo soberano, o Qatar Investment Authority. Como muitos outros países grandes produtores de petróleo, esses fundos são utilizados como uma maneira de impedir que uma quantidade enorme de dinheiro vindo da exportação do produto inunde o mercado local e cause um descontrole inflacionário.
Mas, ao invés de somente adquirir porcentagens minoritárias de negócios promissores, o Fundo de Investimento Soberano do Qatar adquire o controle acionário e atua diretamente na administração de vários negócios, especialmente aqueles que geram grande visibilidade, como uma estratégia de relações públicas.
Entre esses casos, talvez desse o mais famoso seja o PSG – Paris Saint Germain, clube de futebol francês cujo controle acionário e a administração foram assumidas pela QSI Qatar Sports Authority, e chamaram a atenção pela contratação do craque brasileiro Neymar , uma das maiores transações de todos os tempos nesse mercado, e mais recentemente do argentino Lionel Messi, que alguns consideram o maior jogador de futebol em atividade.
No Brasil, há investimentos do Qatar em campos petrolíferos e na companhia aérea Latam.
Rede Al Jazeera
A Al Jazeera Media Network é um canal de televisão via satélite de notícias e atualidades, que transmite notícias em árabe e em vários idiomas, com uma qualidade de conteúdo que equivale às maiores empresas mundiais do ramo. Tem 80 escritórios em todo o mundo..
A Al Jazeera é uma das maiores ferramentas de softpower do governo do Qatar, porque não somente projeta a imagem do país no ocidente, como também porque têm grande audiência em outros países da região, permitindo que o Qatar exerça alguma influência sobre a opinião pública desses países, o que já foi motivo de polêmicas.
Cidade da Educação
A “Cidade da Educação” é uma iniciativa da Fundação do Catar para a Educação, Ciência e Desenvolvimento Humanitário, iniciada em 1997., e que talvez seja o lance mais ousado e inteligente da estratégia do Qatar para se desenvolver economicamente, já que, como vimos aqui, a educação de um povo é um dos principais fatores que influem no desenvolvimento econômico de um país.
Ao invés de enviar os membros de sua elite para estudarem nas melhores universidades do mundo, o Qatar trouxe essas universidades até Doha, onde a população qatari recebe educação de altíssimo nível ministrada em Inglês e Árabe, garantindo que o país tenha capital intelectual disponível para o futuro.
Entre as grandes marcas do mundo acadêmico que têm campus na Cidade da educação estão universidades de renome como Cornell, Texas A&M University, Carnegie Mellon, Georgetown University, HEC Paris e University College of London.
Na Cidade da Educação fica também o estádio que sediou eventos como os Jogos Asiáticos de 2006, Jogos Pan-Arábicos 2011 e diversos jogos da Copa da Ásia. E, possivelmente, também veremos lá alguns jogos da Copa do Mundo de 2022.
Copa do Mundo da FIFA de 2022
Não poderíamos encerrar esse texto sem falar sobre a Copa do Mundo de 2022. O futebol é o esporte mais popular do mundo, e a Copa do Mundo é um evento que o mundo literalmente para para assistir. Se não todo o mundo, pelo menos nós, brasileiros.
Ao conseguir se tornar o primeiro país árabe, de religião muçulmana, a sediar esse evento, o Qatar deu um grande passo na divulgação de sua marca. E podemos esperar nada menos do que algo espetacular em matéria de estruturas e organização nas cinco cidades que serão sedes: Doha, Al Khor, Al Rayyan, Al Wakrah e Lusail. Para se ter uma ideia, o Qatar gastou US$220 bilhões com a construção de metrô, estradas e novos hotéis, que disponibilizarão 13.000 novos apartamentos.
O Qatar fez todo esse investimento para receber um volume esperado de 1,2 milhão de turistas durante a competição, um movimento que deverá gerar receitas de US$. 17 bilhões para o país.
Embora pareça haver uma discrepância entre o investimento para receber a Copa do Mundo da FIFA, e a receita que ela trará, não se engane: o objetivo é mostrar que o Qatar está aí, é uma força a ser levada em conta nas arenas política e econômica mundiais.
Conclusão
O Qatar é um caso de país que tem uma estratégia definida de crescimento econômico e projeção de sua influência na geopolítica mundial, e merece ser observado por todos os que se interessam pelo assunto. E do ponto de vista dos exportadores, representa uma excelente oportunidade para empresas de todos os tamanhos, pelas características únicas do seu mercado, onde são bem aceitos desde produtos alimentícios mais básicos, até itens de luxo, de altíssimo valor agregado, de marcas prestigiadas.
Cabe às empresas brasileiras aproveitarem a oportunidade. E caso não estejam ainda prontas para vender a esse mercado, se prepararem para isso.