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Como o Brasil deve atuar comercialmente na Argentina, Mercosul e na América Latina

O Presidente argentino, Alberto Fernandez fez uma visita não oficial ao Brasil em de maio último, em caráter de cortesia, sendo recebido pelo Presidente Luiz Inácio Lula da Silva e demais autoridades, com o  objetivo de discutir alternativas para incrementar o comércio exterior entre os dois países, que tem sido afetado pela grave crise econômica que nosso vizinho, e maior parceiro no Mercosul, atravessa há alguns anos.

Para o Brasil trata-se de um mercado muito importante, especialmente para a exportação de bens manufaturados, e justamente por essa razão, em tese, um aumento das trocas comerciais com a Argentina seria do interesse da indústria brasileira.

A crise econômica da Argentina

Entretanto, a crise econômica da Argentina tem raízes bastante profundas em decisões políticas e econômicas que o país tomou nos últimos 30 anos, que cobraram o seu preço em matéria de desenvolvimento econômico, social, qualidade da educação no país, que já foi considerado exemplo para a América do Sul, a até da inflação, que no continente, hoje só é abaixo da venezuelana, atingindo dígitos que não eram vistos desde o início da década de 1990.

A Argentina registrou uma inflação de 94,2% em 2022, e tem uma inflação anual de mais de 100% projetada para o ano de  2023, vários tipos de câmbio entre o peso e o dólar, reservas em moeda forte escassas, que não garantem o pagamento das importações e uma dívida em moeda estrangeira crescente, com pendências com o Fundo Monetário Internacional – FMI.

Recentemente, aprofundaram-se os mecanismos de trocas comerciais em moedas nacionais, com aperfeiçoamento dos sistemas dos Bancos Centrais brasileiro e argentino, o que inclui  e aventou-se também a possibilidade de utilização de moeda única no Mercosul, que para a realidade atual dos 4 países membros, é uma completa utopia.

A Argentina já tem um acordo como esse com a China há algum tempo, em que as trocas comerciais entre os dois países podem ser feitas em Peso Argentino ou Renminbi, a Moeda Chinesa, que é erroneamente chamada no Brasil de Yuan.

O acordo feito entre a China e a Argentina  foi interessante para os governos de ambos os países, visto que a Argentina tem uma escassez crônica de dólares e a China tem interesse em internacionalizar sua moeda.

Entretanto, o comércio entre países acontece, na verdade, entre as suas respectivas empresas. Para os exportadores brasileiros, que têm suas despesas em Reais, e eventualmente, em dólares, haveria somente riscos, e pouquíssimas vantagens em vender para a Argentina,  recebendo em moedas nacionais instáveis e voláteis, especialmente o Peso Argentino, tanto que em nenhum momento, foi aventada a obrigação de utilizar tal procedimento.

As exportações brasileiras para a Argentina

As exportações brasileiras para a Argentina aumentaram em mais de 20% em 2023, segundo estimativas do Ministério da Fazenda, mas as poucos brasileiros estão comemorando, pois há mais de 200 empresas brasileiras com dificuldades em receber de importadores argentinos, e vem reduzindo as suas exportações para mitigar os riscos.

Como desestímulo extra, em uma medida que poderia ser considerada um protecionismo disfarçado, a Argentina ainda leva 180 dias para liberar as licenças de importações, o que é prejudicial às empresas brasileiras

O que foi discutido no encontro entre Lula e Alberto Fernandez

 No encontro entre Lula e Alberto Fernandez discutiram-se ações para a criação de estímulos de financiamento às exportações brasileiras via Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), principalmente dos produtos manufaturados, que caso seja aprovado, geraria um compromisso de a licença de importação cair para 30 dias.

Além disso, o Presidente Lula assumiu um compromisso de conversar com a Presidente do Banco de Desenvolvimento (NDB), mais conhecido como Banco dos BRICS, Dilma Roussef, para tratar da crise argentina e buscar soluções financeiras para o país vizinho.

A presença de produtos brasileiros no mercado argentino

Nos dois últimos anos, os produtos brasileiros têm perdido espaço na exportação de manufaturados para a Argentina para produtos chineses, em função do acordo de trocas comerciais entre a China e a Argentina, de operações em moedas locais (Renminbi e Pesos). Os saldos das exportações e importações tem sido liquidados em Renminbi.

Ninguém nega que a Argentina, um dos poucos países onde os manufaturados brasileiros são competitivos é um mercado muito importante paras nossas exportações, e que deve haver esforços econômicos, comerciais e diplomáticos para fortalecer a nossa presença lá. Mas seria tolice negar que também existem riscos.

Os riscos para o Brasil de um empréstimo para a Argentina

As empresas brasileiras que exportam para a Argentina já estão tendo dificuldades com seus recebíveis, e não se pode simplesmente transferir os riscos para o BNDES, ou até para o  Banco dos BRICS, que para se envolver com a operação, teria de ter a concordância dos países membros, além do Brasil: Rússia, Índia, China e África do Sul.

E, visto que a China já organizou seu próprio sistema de comércio bilateral com a Argentina, qual seria o interesse de Pequim em autorizar uma ajuda financeira que teria como principal objetivo, permitir que os exportadores brasileiros sejam mais competitivos no mercado argentino contra os produtos chineses?

Aventou-se a possibilidade de, para não prejudicar o Brasil, a argentina oferecer como garantia aos eventuais empréstimos brasileiros, suas exportações de commodities, como soja, petróleo, entre outras, mas não se explicou como, em caso de inadimplência, essas garantias seriam executadas.

Alternativas para fomentar as exportações brasileiras para a Argentina e outros países da América latina.

Uma das ideias levantadas por especialistas em Comércio Exterior seria a reativação do Convênio de Créditos Recíprocos (CCR), extinto em 2019, pelas autoridades brasileiras, em função de alguns créditos não honrados pelos países latino americanos.

O mecanismo do CCR era administrado pelos Bancos Centrais dos países latino americanos que utilizavam um sistema de compensações quadrimestralmente, entre exportações e importações, com garantias dos referidos. Tal instrumento incentivou sobre maneira as trocas comerciais entre os países latino americanos.

O NDB- Banco dos BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) poderia garantir a linha de crédito à Argentina, e a utilização do CCR,   a compensação necessária, diluindo riscos.

Conclusão

A volta do CCR seria um tema para reflexão de nossas autoridades, pois pode ser uma alternativa para fomentar as trocas comerciais da América Latina. As mudanças ocorridas no mundo, como a pandemia, a guerra na Ucrânia e a reversão da Globalização Econômica deixaram o mundo completamente desorientado de políticas de estímulos ao comércio internacional, e nos obrigam a sermos criativos.

Além disso, preservar as relações entre o Brasil e a Argentina, o Mercosul e os demais países latinos americanos é importante para retomar a liderança brasileira na região,  como foi no passado. Mas sem expor as empresas brasileiras a riscos exagerados.

 

 

 

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